A GABRIELA QUE VEIO A PASSEIO
Uma menina linda, chamada Gabriela, trabalhava de manicure num salão de beleza de São Leopoldo, minha cidade. Fui lá algumas vezes, e a Gabriela pintou minhas unhas. Mas eu saía sempre pensando: “essa menina tinha que ser modelo, e não ficar aqui fazendo mãos”...
Não deu outra. Gabriela ganhou, de aniversário de quinze anos, uma viagem para o Rio de Janeiro. Veio para a casa de uns parentes, ia ficar só uns dias. A passeio.
A passeio, foi conhecer o BarraShopping. A passeio, foi descoberta por um caça-talentos de uma agência de modelos - que a abordou num corredor, e convidou-a para fazer uns testes.
Passou nos testes, e acabou-se o passeio. Ou, melhor: Gabriela agora está “passeando” nas passarelas, morando aqui na cidade maravilhosa, feliz e esperançosa da vida. Nunca imaginou.
Não é uma história bonitinha? Pois é, verdade verdadeira.
TERRA DE VAGAS MAGRAS
Já eu, que não tenho os olhos azuis e o semblante angelical de Gabriela, posso até fazer uma vala nos corredores do BarraShopping, que não vai ter jeito: ninguém vai me querer para desfile.
Conformada com minhas qualidades estéticas bem comunzinhas, e até meio satisfeita com elas, estou procurando é um emprego de gente normal, pela primeira vez na vida. Sim, porque trabalho com música há 12 anos, mas já vi que isso não conta muito; tenho certa dificuldade de me cadastrar nos formulários das empresas, que, normalmente, classificam minhas experiências com uma só palavra: “Outros”.
Eu sou da turma dos “outros”, portanto. Não tenho nome de empresa anterior para citar, não tenho quem me indique, quem me reconheça, quem me recomende, nada. O pessoal que recebe meu currículo deve pensar que eu não tenho sequer função.
Pensando bem, eu tenho, sim, uma função: outros.
Quanto será que eles pagam para o pessoal do cargo “outros”? É o que tem me tirado o sono, uma vez que o telefone não toca, não recebo e-mail, carta, convite para entrevista, dinâmica de grupo, etc.
Confesso, tímida, que nunca fiz uma dinâmica de grupo. Contam as minhas amigas que costuma ser uma coisa bobinha, mas eu, como nunca tive a experiência, acho chiquérrimo. Estou louca para fazer uma dinâmica de grupo, não vejo a hora.
Minha máxima noção de dinâmica de grupo, até hoje, foi fazer um sinal para o guitarrista na hora do solo, ou, na falta de outro membro disponível, levantar a perna esquerda para indicar ao baterista o final da canção. Eles me retribuem, com caretas, como convém a todo músico que se preze. Maravilhoso.
Mas isso é outra coisa que não conta.
Portanto, estou aceitando sugestões. Quero um emprego que conte, mesmo que seja no setor “outros”.
Afinal, nesta terra de vagas magras, quem tem um “outros” é rei.