27 dezembro 2002

LAY OUT NOVO

O BiBlog comemora o Natal, e quem ganha o presente é você! Aliás, nós, porque também eu fiquei surpresa ao me deparar com o novo lay out - a responsável pela arte é a minha amiga Melissa.
Valeu, Me!! Adoramos!

A propósito, eu também achei que estava no lugar errado até reconhecer meu próprio blog, vestido de nova cor... caiu-lhe muito bem, ali(L)ás!

É bom entrar o ano de roupa nova, dizem. Estou nessa, agora, até virtualmente.

Vocês já entraram no clima de réveillon? Eu recém comecei a me animar e a pensar a respeito. Não sei de vocês, mas eu não sou daquelas pessoas que têm pavor das festas de fim de ano, não. Eu sempre gostei, principalmente da virada.

No Natal a gente ganha presente; na virada a gente ganha futuro. Tem aquela coisa meio ilusória de virar a vida de cabeça para baixo, chutar um balde ou outro, arrumar de vez o que nunca esteve lá muito certo. Gosto dessa promessa, ainda que fique só na intenção. Não me incomodo com as fantasias que não se concretizam nunca; para falar a verdade, acho mesmo que são elas as mais interessantes.

O concreto deixa de ser infinito no momento em que vira fato, não? Que graça?

Eu gosto de ter um pezinho sempre no infinito, no ilimitado, no - por que não? - inatingível. Nunca fui muito de cercar as idéias com tijolos; depois dá muito trabalho para pular e ver o que há do lado de fora delas.

É por isso que eu não me incomodo com a inquietude da possibilidade, com a insensatez da ilusão, com o não cumprimento de alguma coisa que parecia fadada ao êxito. Melhor estar sempre em aberto.

Em 2003 eu quero abrir exceções, fazer concessões, criar possibilidades. Posso sair da rotina, experimentar novas sensações, selecionar hábitos inusitados e incorporá-los. Incorporar hábitos é preciso.

Vou abrir algumas lacunas e deixar ventilando, sem me preocupar em tapar furos, cobrir frestas, definir, socar, sufocar, resolver. Um pouco de ar, em 2003, não fará mal a ninguém.

Só isso já vai ser trabalho duro, mas cavalo que corre por gosto não cansa. E ninguém mandou eu não gostar de cercas.







25 dezembro 2002

Vocês são uns amores! Mesmo na minha ausência, apareceram para registrar votos de bom Natal. Obrigada! Retribuo com sinceros desejos de paz e felicidades para o próximo ano.

A minha noite de Natal foi ótima. Comecei tocando violão e cantando com a parentada, e terminei às 6h da manhã de hoje, chegando em casa acabada de uma festa com minha incansável prima de 18 anos.

Chegamos na cervejaria/boate pouco depois da meia-noite. Olhares inquietos, expectativas, esperanças, vestidos de vários tamanhos e estilos. Homens de camisa vermelha, cumprimentos, sorrisinhos ensaiados e improvisados. Aquela coisa.

"O que será que eles procuram aqui?" - meu lado sagitariano-filosófico-enfadonho ameaça botar as garras sobre a minha saudável noite fútil. Controle-se, é apenas uma noite. Fútil.

Resolvo me distrair com as belezas humanas desta terra abençoada por Deus, e me encanto por um daqueles vários meninos de vermelho - que, para meu desânimo, engata-se de súbito a uma loura monumental, e desaparece entre os cachos dourados para nunca mais retornar a este reles mundo dos mortais.

Pronto. Menos um.

Relaxe, aconselho a meus neurônios mais afoitos, é Natal. Minha prima pergunta se eu quero dançar, eu pergunto quando vai começar a música, ela responde que é aquilo ali mesmo. Achei que estavam consertando alguma coisa na boate, pois o barulho mais se parecia com um martelo insistente do que, propriamente, com alguma canção. Mas ela reafirma: é isso aí que tem.

Pronto. Menos uma.

Não sou de dar carão; aceitei o convite e fui à luta. No início, me senti um pouco ridícula. Depois, foi piorando. Mas o importante é competir - eu me consolava, enquanto uma adolescente descompassada e meio bêbada se sacudia do meu lado, e depois ia se agachando até o chão, com as duas mãos na cabeça, e fazendo biquinho. Não estou tão mal assim, afinal.

Depois de uma "música" vinha outra, e outra, e ainda outra. Aquele aglomerado ia ficando cada vez mais parecido com uma coisa só. À medida que ia entrando mais gente na pista, a sensação era de que eu ia perdendo o controle sobre os meus próprios movimentos, passando a fazer parte de uma massa nervosa e compulsiva, ali, quicando ao bater de cada martelada. Era a dança.

- Quando não agüentar mais, é só falar... - ela me advertia, com olhar quase piedoso.

- Imagina! - eu tentava disfarçar.

- É só falar... - eu não conseguia disfarçar.

Joguei a toalha quando meus calcanhares já estavam dormentes, meus dedos pisoteados e esborrachados de inchaço, meus quadris apenas mexendo uma vez a cada duas ou três marteladas.

- Vamos dar uma voltinha? - ensaiei um sorriso e dei uma piscadela, como quem quer ver se encontra algum pretendente ou coisa parecida. Colou.

Ela saiu na frente, ainda rebolando ao ritmo da massa. Eu saí atrás, gemendo em silêncio e pisando manso, para ver se a sola dos pés latejava um pouco menos, se eu voltava a sentir as pernas, se a minha cabeça parava de clamar por duas aspirinas e silêncio.

O pretendente? Se meu travesseiro me aparecesse montado num cavalo branco, eu casava na hora. Com qualquer um dos dois.

Demos várias voltas pela boate, mas adiantou muito pouco. As minhas dores foram piorando; minha prima foi se animando. A morte era questão de tempo.

Agüentei no osso equanto deu. Passava das quatro da manhã quando eu sugeri que fôssemos indo, ela teria que viajar hoje ainda com a família, podia se sentir cansada... mas errei o alvo. Ela sorriu, tranqüila:

- Que nada! Tenho gás para virar a noite aqui dentro e depois sair de viagem, numa boa!

Mais uma hora quicando numa pista de luzes piscantes e fumaças variadas. Quem mandou eu não ser sincera? Bem feito.

Cinco horas, abri o jogo: o papo (?) está bom, mas a carroagem tá virando abóbora. Mais cinco minutos, e eu só saio daqui de cadeira de rodas.

Fim de combate. Chegamos em casa ao clarear do dia de Natal. Tirei a farda e a sandália, deitei na cama e ainda quis iniciar uma oração, mas confesso que o sinal da cruz foi só até o nome do filho.

Capotei com a mão no peito, como uma guerreira esgotada, porém feliz.
E já prometi a mim mesma: da próxima vez, vou de coturno. Muito mais adequado a esse tipo de enfrentamento pesado.


19 dezembro 2002

NEM TODA CATARINA É SANTA

O quê?? Tá brincando! Santa Catarina é o paraíso perdido, ou melhor, achado. Da última vez em que estive lá, foi preciso um guindaste para me levar de volta ao Rio. O máximo a que eu chego é Torres, perto do fim do ano, que infelizmente não vai dar para atravessar a fronteira e me meter na ilha da magia desta vez. Desta vez!

11 SHOUT OUTS

Qual não foi minha surpresa ao me deparar, hoje, com onze recadinhos de vocês! Muito obrigada, muito "agradicida mêsss"... adoro receber vocês aqui, do contrário seríamos apenas eu e meu eco eu e meu eco eu e meu eco eu e meu eco... ad infinitum.

FAMÍLIA, Ê, FAMÍLIA, AH, FAMÍLIA!

Tem coisa mais gostosa no mundo?
Eu tenho o maior prazer em reservar minhas horas e meus dias somente para o convívio familiar. Quem tem família sempre por perto pode não dar tanta importância, mas a gente, que mora longe, acaba se deliciando ao som das vozes que sempre estiveram ali, desde sempre. Soa como canção de ninar.

Eles dizem, família é coisa complicada. É nada. Não há nada mais simples neste mundo do que essa bagunça generalizada, vozes altas, crianças estabanadas puxando a toalha da mesa, a vó não vai deixar o cigarro, Vó? Cuide da sua vida! Como cresceu! Pintou o cabelo, foi? Está mais magro, ou é impressão minha? Põe os óculos, mãe, não assina o cheque assim, sem ver nada, pode ser perigoso... falar nisso, e o Rio de Janeiro?

Ontem eu vi o olhar da minha prima numa foto minha. Pode haver generosidade mais espontânea do que essa? Ela nem sabe, nem pensou em permitir, nunca pensou no assunto. Mas está lá, para quem quiser ver. Há uma cumplicidade implícita nisto; há mais que parentesco, mais que parceria.

Família é isso, simples assim; é dividir até o olhar.

17 dezembro 2002

Oi, meus queridos e minhas queridas.

Peço que não reparem n'algum possível erro de digitação. São duas da manhã, e estou sonolentamente me encaminhando a meus aposentos; só vim aqui mesmo para não deixá-los mais um dia órfãos de minhas sandices pseudo-literárias.

Escrevo do Rio Grande do Sul, mais precisamente de São Léo, Minha Terra. Vim passar as festas de fim de ano com minha família, embora tenha deixado boa parte dela no Rio de Janeiro - mas, tudo bem, nada é perfeito mesmo. Minto: o céu azul do Rio Grande do Sul é perfeito.

Desculpem minha crise de paixonite declarada ao estado que me pariu - juro, é temporário, e não é fruto de bairrismo algum. Apenas coisa de gaúcha que se auto-exilou dos pampas, por livre e espontânea vontade, e agora deixa de ser fiel: tem um marido gaúcho e um amante carioca, cada qual com suas belezas e seus sotaques inconfundíveis, fazendo com que meu coração bata em samba e milonga ao mesmo tempo.

Ops!, espero que entendam a minha metáfora: meu marido é o meu doce Rio Grande - casório registrado na minha certidão e tudo -, com quem me envolvo amorosamente desde que me conheço por carne e osso duro de roer, como convém a toda gaúcha que preze as tradições pampeanas.

Meu amante é um carioca, digo, um estado chamado Rio de Janeiro, onde instalei minhas letras e músicas assim que fiz 20 anos - e de onde não pretendo sair tão cedo. Claro que dou minhas escapadelas, que ninguém é de ferro, e o maridão sulista acaba recebendo o ar da minha graça volta e meia.

E chego sem aviso prévio, que é para pegar o peão no pulo, se for o caso. Ai dele!

Mulher é bicho bem sonso, mesmo.
Daqui a uns dias eu volto, com a maior cara de paisagem, e dou "aquele abraço" no Redentor. Finjo que só fui ali na esquina comprar pão...
Ele acredita, e fica tudo bem.

Isso se vocês não derem com as teclas nos dentes, né???

13 dezembro 2002

Ontem me deu vontade de sair de maria-chiquinha, mas não tive coragem. Eu tenho coragem para tanta coisa, desde escrever uma música boba e assinar embaixo até gostar de rúcula, mas me pelo de medo de um penteado infantil. Talvez eu tenha receio de que alguém ria de mim; mesmo assim é estranho, porque eu passo boa parte da vida fazendo ou dizendo ou escrevendo coisas para que os outros riam de mim. Mas, não sei, o penteado me pegou de jeito.

Claro que eu não fiz aquela maria-chiquinha inteira, sabe como é, deixei boa parte do cabelo solto, como quem diz que eu sou adulta e tal. Mesmo assim, quem olhasse de frente ia perceber que eu reparti com pente, e não reparto com pente há vários anos. Tanto é verdade, que não consegui deixar lá muito retinho. Pelo menos isso eu tinha a favor, o repartido estava meio indeciso, coisa de gente que não sai de maria-chiquinha todos os dias.

E ficaram uns fiapos rebeldes, escapando do elástico, e eu peguei uma presilha, mas uma só ficava assimétrico, peguei duas, não deram conta, peguei logo quatro, e o pior estava por vir, quando olhei no espelho, eu, ali, duas chiquinhas, uma de cada lado, quatro presilhas, duas de cada lado, putz!, não é que ficou ótimo?

Ficou tri bonitinho – eu diria.

Ainda assim, o espelho me encorajando, o horário da saída estourando, o rímel ajudando, o batom enfeitando, eu não pude, eu não sei, eu ando tão... sem chiquinhas.

Arranquei tudo num só golpe, e saí com o cabelo solto, como de adulta, como de praxe. Mas as chiquinhas foram comigo, só que do lado de dentro da cabeça. Como quase tudo que eu tenho.

Olhava no espelho, e não era mais uma mulher de cabelo solto. Era uma mulher sem maria-chiquinha. Havia um desfalque, sim, e não era coisa da minha cabeça, apesar de ser. Cadê que eu me sentia inteira, cadê que eu esquecia o acontecimento de não ter saído enfeitada?

Estava feia, velha e gorda. E pálida, e abatida, o sorriso era flácido, o olho cansado, o gesto era lerdo e o passo era torto. Sem brilho, sabe?

Também, com esse meu nome! Se eu me chamasse Kátia com K, talvez ficasse mais fácil andar por aí de maria-chiquinha, até porque, se for reparar, o próprio K já vem com esse penteado no desenho, olha aí. O Y é outro.

Quando resolvi voltar para a casa, com aquele ar fracassado e até meio doentio, ocorreu-me, de súbito, uma idéia que revolucionaria o meu passeio para todo o sempre. Não devo ser tão extremista, já diria minha terapeuta e o próprio Buda. Devo ir com calma, uma coisa de cada vez, uma coisa de cada vez, uma coisa de cada... vez!!!

Olhei-me no reflexo do vidro mesmo, não podia esperar um espelho. E puxei um naco de cabelo com a mão direita, e dei uma enroladinha com o dedo, e prendi com elástico, ali mesmo, em meio ao burburinho, dane-se.

Passei o resto da noite com meia-maria-chiquinha, um só belo rabo, assimétrico mesmo, feito um Y perneta. Uma coisa de cada vez.

Assim eu vou me acostumando e perco a timidez. Hoje, vou com o rabo esquerdo.

Por enquanto eu nem chamo atenção e ninguém ri de mim, ou, se ri, só pode rir pela metade. Mas eu vou me preparando, vai chegar o dia em que vou chutar o balde, não quero nem saber, saio de maria-chiquinha completa e minhas presilhas todas.

Se alguém olhar torto, ponho a língua mesmo. Aí vai ser um Y e um P.

12 dezembro 2002

Óóó, pobres BiBlogólatras Anônimos, quer dizer que sentiram minha falta, foi? Pois, que peninha, também agora estou sem tempo de acarinhá-los como deveria.

Das últimas notícias que me vieram perturbar os ouvidos, a pior foi – e está sendo – a tragédia em Angra dos Reis, é claro. Se bem que, aqui pensando, é de causar semelhante mal-estar a seguinte novidade: “Kelly Key lança REMIXES INÉDITOS”.

Não estou de brincadeira, e o termo não é meu (eu não seria capaz de criar tal pérola). Acreditem, “REMIXES INÉDITOS”. Eu me ponho a refletir sobre o que poderia vir a ser um REMIX INÉDITO. A julgar pelo prefixo “RE” - que, salvo engano, significa tudo, menos algo NOVO! -, então a expressão me parece seriamente equivocada. Para dizer o mínimo.

No entanto, quem inventou a pérola tem minha honesta admiração, e até minha peçonhenta inveja, se quiser. Está aqui estampado o supra-sumo desse vácuo criativo em que se encontram os artistas “top” das nossas “paradas radiofônicas”: REMIXES INÉDITOS!

Aliás, não existe coisa mais PARADA, de fato; com perdão do trocadilho inevitável.

Estou ansiosa para conhecer o novo-lançamento-re-inédito-mixado da cantora Kelly Key. Há de ser surpreendente.

O mercado fonográfico brasileiro encontrou a chave (key?) do sucesso; desde então, eu ouço rádios gagas e gagás, re-re-re-re-repetindo as mesmas paradas e babando, baby, babando no molhado.

Valha-me Deus, quisera isso tudo fosse apenas uma crônica ácida de alguma baixista solitária, rejeitada e mal amada, soterrada numa clave de fá. Seria menos dolorido, pois com a minha rabugice eu já me entendo há décadas.

O que não dá para entender é essa usina de re-novidades re-inéditas.
Re-voltante, não?

04 dezembro 2002


www.renatoborghetti.com.br

Agora que aprendi a postar fotos aqui, ninguém me escapa.
Confiram a beleza incalculável desse gaúcho talentoso (suspiros) e seu companheiro pingo (cavalo, em gauchês).
Não sei se tudo isso é saudade dos pampas, mas... BARBARIDADE, COMO DEUS É CAPRICHOSO !!!
Conflitos


Não tem graça nenhuma você, com a chave na mão, como quem vai embora, conferindo a carteira e os bolsos para ver se lembra onde escondeu a alegria.

Fosse eu mais romântica um pouco, tascava um beijo de despedida e mandava o outro olhar no espelho, ver se acaso achava ali a alegria perdida. Em vez disso, careço da meiguice apropriada; já nasci assim meio desajeitada, nunca sei o que fazer com as flores. Tenho medo de apalpá-las demais e aquilo me queimar, eu derreter, Deus me livre, derreter.

Pior você, que não ajeita nem desajeita, não parte e não ata, não chora, não implora e não se evapora logo embora. Pior você, pouco honesta, indo e vindo, a emoção balançando no céu e a razão atirando pra matar.

O último coração que amou e a cabeça mandava dizer que era mentira e era mentira, o pobre batucava mais que tamborim no sambódromo, mesmo assim era mentira e era mentira. Até que o vivente se achou exausto do bate-boca e ordenou: decidam vocês!

Não deu meia hora, saíram abraçados – cabeça e coração. Que briga sem platéia não tem graça.

Ora, o conflito sempre vai haver; o que não pode é ficar dando trela pra ele.

03 dezembro 2002


Os meninos e eu. :o)

Ana Lógica

só um teste.
Um pouco de abraço, em meio ao movimento, não cairia mal. Um laço solto, depois de tanto aperto. Uma brecha entre o alvo e a flecha, para não viciar no acerto em cheio – ficar um pouco no meio, para variar.

Se a gente deixasse o colo mais livre, sorrisse mais fácil, cultuasse o quente ao invés do frio. Se a vaidade permitisse um traço torto, se a pretensão cobrasse menos, se o orgulho nos liberasse mais. Se o compasso espichasse no final da canção, só para fazer uma graça; sem mania de perfeição, sem razão, sem nada.

Talvez não precisássemos repor as energias - se não as derrubássemos no caminho da angústia. Poderíamos, quem sabe, ir andando conforme o acaso ou o destino determinasse, tanto faria; estaríamos respirando lento e rindo frouxo, ao vento. Se ainda soubéssemos como se faz.

Alguém perdeu o acesso à suavidade dos dias, nalgum lugar de um remoto passado, e fomos atrás do atalho errado. A marcha foi ficando mais pesada, mais pesada, nossos coturnos foram engrossando, e nossa casca aumentando, nosso uniforme sufocando nossa emoção desbotada.

Seria útil pensar onde era, mesmo, que pretendíamos chegar.
OFFICINA

Saiu a nova edição da Officina do Pensamento - http://www.officinadopensamento.com.br/

Visitem! Estou na parte dos "musicais", com minha coluna e uma entrevista que me foi gentilmente cedida por um dos meus ídolos na música brasileira, o Luiz Tatit. Quem não conhece, vale a pena conhecer.

01 dezembro 2002

Aaaaaaai, minha Nossa Senhora do Recreio dos Bandeirantes, dai-me força e coragem e disposição para encarar este calor dos diab..., digo, com todo respeito, Nossa Senhora, este calor de derreter gaúcha branquela que há muito evita o sol na moleira.

E, já que estamos falando em forças, ó bondosa, dai-me também paciência para não me precipitar, violenta e desastrosamente, para cima de um carioca protagonista de cena como a que eu vi agorinha há pouco: imagine a Senhora, pleno meio-dia dominical de sol que racha, eu, saindo do supermercado, cheia de sacolas, suada, irritada e apressada, vou em direção ao meu automóvel, quando ouço uma sinfonia estridente de buzinas em pleno estacionamento. Que se passa? – indago às minhas sacolas, não sem acrescentar, ao final da pergunta, três ou quatro palavras de baixíssimo calão, coisa que aqui não me atrevo a redigir, visto que a Senhora pode se ofender e, pior, muito pior, ainda inventar de me punir.

Os buzinantes protestavam, acredite, contra um carro que repousava, inerte, exatamente no MEIO do único local pelo qual se poderia passar, caso alguém quisesse, por acaso, sair do supermercado e ir para casa. O motorista?, ausente.

Entrei no meu carro, que já mais parecia um forno elétrico que alguém esquecera ligado por dois dias, e fiquei ali, aguardando aquele boiol..., desculpe-me, aquele motorista se decidir e, enfim, remover dali o polêmico veículo.

Tinha gente querendo passar por cima, tinha gente buzinando, tinha gente cantando pneu para ver se o dono do carro se assustava. Chamavam-no, aliás, de todos os nomes feios que a Senhora possa imaginar. Tentaram bastante, mas acho que não acertaram, porque ele não atendia.

Como sou uma pessoa mui compreensiva e até serena, fiquei a imaginar que razão poderia ter levado o boiola (ops!) a largar o carro ali mesmo. Só poderia ter sido algo de urgência extrema, e, creio, algo muito pessoal e intransferível. Ou, por outra: o veado estava mijando, claro.

Relaxei um pouco. Urina é coisa séria, chega uma hora em que ninguém segura. Coitado. Fez o que pôde.

Foi eu terminar de perdoar o elemento, e já me arrependi. De repente, apareceu, com cara de que não era com ele, entrou no carro e foi-se embora. Tinha ido comprar flores na banca ao lado, e não quis estacionar numa vaga comum; preferiu parar o carro ali mesmo, que era mais perto.

O coro aumentou dez vezes; os outros motoristas estavam ainda mais indignados, mas aí o sujeito já tinha partido, e devia estar dando risadas ao conferir, pelo retrovisor, dezenas de babacas furiosos xingando ao vento.

Está certo, Nossa Senhora, tem aquele negócio da outra face. Eu entendo que deva ser também bondosa, e perdoar o motorista fujão. Está bem, está bem, vamos virar esta página, eu não guardo ressentimento algum do boiola, digo, do comprador de flores.

Coitadinho. Na certa, deve ser aniversário da mãezinha dele, e o pobre doce filho, ao perceber que se esquecera de levar uma lembrancinha, não pensou duas vezes: parou ali mesmo, juntou os últimos trocados, e foi comprar um bocado de flores.

Muito bonito da parte dele, uma vez que a mãe deve ter chegado em casa exausta, pela manhã, depois de mais uma duríssima noite de trabalho na Av. Atlântica, em Copacabana, onde ganha a vida.

30 novembro 2002

Boas!!

Em primeiro lugar, fiquem sabendo que eu leio, sim, todos os recadinhos que vocês me deixam aqui. Não costumo responder um a um, porque já sou meio relapsa com os textos, imaginem se eu for tentar agradá-los nos recados... sei, eu sei que eu seria um fracasso.

Como vocês estão? Eu estou bem, fora o calor carioca. Fui à Lapa, na quarta à noite, e dancei um bocado – coisa que não fazia há muito. Mas ainda não tive coragem de enfrentar a praia, ao menos durante o dia.

Hoje eu vi uma notícia no Jornal Nacional, talvez a mais chocante dos últimos tempos, no meu modesto entender. Vocês devem ter visto.

Tratava-se do aumento da produção de munição de guerra nos Estados Unidos. Dizem que, depois do fatídico 11 de setembro, muitos americanos decidiram rumar para o setor bélico, trocando de emprego, passando a fabricar bombas.

Uma mulher americana largou seu trabalho na área farmacêutica e foi construir bombas. Ela ganhava mais com os remédios, mas, segundo afirmava, ficara chocada com o atentado às torres gêmeas, de modo que pensou: “Preciso fazer alguma coisa pela minha pátria”.

Agora ela se sente muito mais tranqüila, porque sabe que está ajudando o seu país. Ganhando menos. E fazendo bomba.

Estamos acostumados a ver a morte estúpida, todos os dias, na tevê. Isso é chocante, é execrável, é repugnante – mas, por mais frio que possa parecer, até morte está banalizada. E a gente assiste a assassinatos, entre um gole e outro de cerveja, como se fosse apenas mais um absurdo entre tantos.

No entanto, quando aparece algo assim, como uma cidadã que deixa seu emprego para “servir à pátria” fabricando coisas que explodem, aí sim é que eu me choco de verdade. Porque a morte está ali, nas mãos satisfeitas daquela mulher, em estado primitivo. A morte em potencial, adotada (e adorada!) como solução.

Assim fica difícil, não é?

25 novembro 2002

ANIVERSÁRIO

É, queridos, estou mais velha. Uma jovem adulta, segundo dizem. Tudo bem, 25 é um número bonito, mas estou muito diferente (aquém - seria a palavra exata) do que me imaginava ser aos 25.

Tenho até um querido diário, onde lembro ter escrito, aos 12 anos de idade, que pretendia ser psicóloga com essa idade. Mas uma coisa deu certo: eu queria morar no Rio de Janeiro – que recém tinha conhecido. E outra: eu queria não ter mais que usar óculos. E outra: eu queria ter cabelo comprido. E outra: eu queria continuar escrevendo bastante.

Mas não imaginava que, um dia, fosse escrever coisinhas num computador, e muito menos publicá-las numa espécie de diário virtual. E também não imaginava que, no ano seguinte (aos 12), eu fosse me enfiar numa banda de rock que se formou dentro da minha própria casa, e resolvesse então cantar as coisas que eu escrevesse.

Acho que a psicologia ficou engavetada nos meus escritos, lá onde, sorrateiramente, dou conselhos a mim mesma – os quais não sigo, porque santo de casa não faz milagre -, numa espécie de autoterapia compulsiva. E a doida segue, por outro lado, a desafiar a sanidade da psicóloga, de modo que eu mesma já não sei mais qual das duas é mais perturbada das idéias.

Minha vó Maria ainda acha que eu poderia enveredar para os lados acadêmicos da psique. Diz que dá tempo, e tudo. Mas eu não sei se a doida aqui deveria suspender as atividades, e ir se aboletar do outro lado do divã por uns tempos. Talvez a psicóloga ficasse frustrada, de tanto correr atrás da cura da doida e não achar. Não sei. Ou, vai ver que é preguiça mesmo.

De qualquer forma, está bom assim, sem a psicologia, mas com as cordas do baixo, as músicas, as letras, os desejos, os medos, as paixões, as crises, as alegrias e os espetinhos de coração de galinha que meu irmão faz como ninguém.

Sim, ontem a festa foi com espetinhos, se alguém quer saber.

(Vocês já notaram que eu, quando invento de filosofar além da conta, meto sempre um espetinho no meio? Acho que é para descontrair. Meu irmão é bom nisso, aliás. Na descontração e no espeto).

Por voltar a falar em aniversário, agradeço muitíssimo aos recadinhos de vocês, sempre tão assíduos (as) e docemente carinhosos (as) comigo. Obrigada. Agora, vamos mudar de assunto antes que eu me sinta uma jovem senhora, de tanto falar em idade...


SHOW DO RUSH

Eu fui!!!

Talvez vocês não gostem do Rush - trio de rock canadense com 35 anos de carreira, aquele da música tema de “Profissão: Perigo”, quem tem mais de 20 deve lembrar. Mas vamos mudar de assunto, que esse negócio de mais de 20 já me remeteu a... vocês sabem.

Talvez a maioria de vocês nem sequer tenha prestado atenção no tal do Rush. Mas eu sou fã, muito fã mesmo, e nunca pensei que pudesse ver um dos meus maiores ídolos, o baixista e vocalista Geddy Lee, ao vivo.

Foi ali, no maior estádio do mundo, que eu tive a maior emoção do mundo quando o Rush apareceu, de verdade, em carne, osso e o Mi Maior da primeira canção, Tom Sawyer – aquela que eu, há oito anos, em entrevista a uma revista da minha cidade, citei como minha canção preferida.

Era o Mi Maior do Mundo.

O Maracanã estava em êxtase, enquanto eu me forçava a olhar só o telão, só o telão, só o telão, Bíbi, senão desmaia. Claro que não me contive; olhei mesmo. Graças a Deus, o Geddy Lee ficava do tamanho da unha do meu dedão, porque eu estava sentada do outro lado do estádio. Foi o que me salvou de despencar, dura e pálida, e virar tapete na hora.

Não virei tapete, mas também não estava lá muito em estado de gente. Virei uma coisa que pulsava, vibrava e arrepiava, embora estática por fora, meio incrédula, a segurar a boca com a mão direita, no afã de não deixar escapar nem um fiozinho de emoção. Sou assim, diante das maiores coisas do mundo: faço de conta que é tudo de faz de conta, pra não pirar de verdade.

Vieram outras canções, e outras mais. Do meu lado esquerdo, meu irmão e guitarrista. Lado direito, nosso amigo e baterista. À frente, outro trio nos chamava atenção: três meninos, deviam ter uns 12 anos, cada um fazendo os gestos do seu instrumento, tocando no vento. Uma banda de rock, certamente.

O trio canadense, o nosso trio, e o trio mirim. Cada qual mais diferente do outro, e mais igual impossível.

Claro que era mais que um evento, um espetáculo de som e luzes. Claro que era muito mais que uma banda preferida, um ídolo, um “obrigado” agudo e com sotaque estrangeiro. Era a sinergia que faz com que um trio se torne uma banda, assim, como num toque mágico. Deixam de ser Geddy, Alex e Neil – viram uma coisa só.

É difícil entrar nessa e não querer ficar. Complicado abandonar aquilo que nos mantém maior do que somos, não porque inflamos, mas porque amamos.

Como dizer àqueles meninos que é difícil, que a estrada, que a falta de grana, que as gravadoras, que os botecos vazios, que os bêbados chatos... que nada! Está ali, bem à frente, uma chance que deu certo – um trio que faz rock há 35 anos. E ponto. Mesmo que seja só um, entre tantos que se desfizeram, já nos faz querer ficar, ir tentando enquanto dá.

Até porque, no fundo, estamos todos tocando no vento; os instrumentos estão ali por um mero acaso.

22 novembro 2002

Buenas!

Vejo que gostaram do meu álbum virtual, e – especialmente – da minha prova de honestidade, mostrando, em cores, a performance de minha cunhada Erica e sua sombrinha do frevo.

Muito bem, também concordo que ela é lindíssima, “fofa”, e os demais adjetivos que foram justamente postos no nosso muralzinho de recados para elogiá-la. Quem não concorda com isso, naturalmente, carece de saúde mental e/ou necessita comparecer com urgência a um oftalmologista. (Eu escreveria “oculista”, mas minha mãe Aninha viria, toda autoritária, no “shout out” – onde ela só aparece para me dar broncas ou enfatizar seu gosto pelos quilômetros que nos separam, bradando: NÃO É OCULISTA, MINHA FILHA! DIZER OCULISTA É FEIO!!! DIZ-SE OFTALMO, OFTALMO!!).

Em tempo: onde minha mãe diria “é feio”, leia-se É CRIME. Para ela, dá no mesmo.

Mas, voltando. Rasgo-me em elogios à minha cunhada Erica, sim, sem vergonha de parecer que estou puxando o saco ou coisa que o valha, pois nem teria motivo algum para isso, e não é do meu feitio, todos sabem.

Está certo que, terça-feira passada, véspera de feriado aqui no Rio, Eriquinha – uso diminutivos somente quando prezo a pessoa além da média – convenceu meu sensato irmão a atravessar a Av. das Américas, em pleno horário de pico, cruzando Barra da Tijuca, São Conrado, Leblon, Ipanema e Copacabana (dando então uma paradinha estratégica num quiosque à beira da praia, onde havia uma maluca com cabelo de piaçava gritando com seu ex-marido e ameaçando chamar a polícia), depois ir até o tradicional bairro de Botafogo, encarando um trânsito de querer chutar o guarda, tudo isso somente para quê?

PARA ME LEVAR AO “BAR DO ACARAJÉ”!!!

Sim, caros amigos, eu não farei 25 anos sem ter provado um saboroso, apetitoso, cheiroso e crocante... acarajé. Digo-lhes, com franqueza absoluta, que o salgado me cativou logo de início, quando me apareceu, dividido ao meio, transbordando de recheio, aboletado naquele felizardo pratinho.

O que pude entender do petisco – para quem eventualmente o desconheça - foi o seguinte: tratava-se de uma massa, com uma gosma por cima, mais um molho colorido e uns camarões. Não sei que tipo de massa, nem o que era a gosma, nem o nome do molho, e nem bem tenho certeza de que aqueles animais eram, de fato, camarões. Mas, garanto: o conjunto da coisa funciona. E como.

É algo mais ou menos como ouvir jazz: você não entende nada, mas concorda – só por via das dúvidas.

A diferença entre o acarajé e o jazz, contudo, fica por conta da rebordosa. Meus queridos, não queiram saber o quanto passei mal naquela noite – e, juro, comi somente UM bolinho daqueles. Foi o suficiente.

Cá entre nós, é praticamente uma bomba gástrica, cuja digestão não acontece antes de, no mínimo: uma noite em claro, umas colheradas generosas de sal de frutas, dois litros de água mineral com gás, quatro voltas na quadra e dezenas de visitas (frustradas ou não) ao vaso sanitário.

No dia seguinte, não acordei – porque sequer havia dormido -, mas levantei-me ainda com a nítida impressão de estar grávida de uma dinamite querendo explodir a qualquer hora.

No entanto, era pior: eu paria de quinze em quinze minutos. (Sem querer entrar em detalhes, claro).

Mas nada disso me surpreende, amigos. Eu nasci há dez mil anos atrás. Já vi de tudo nesta vida.

Só não vi (e desafio que me mostrem) presente de cunhada que não acabe em bomba.

Hihihi...

19 novembro 2002

MEU ÁLBUM DE FOTOS PARA VOCÊS

Quem quiser dar uma olhadinha nas minhas fotos, enquanto eu não consigo publicá-las aqui (por falta de talento mesmo), vá em http://fotos.terra.com.br/album.cgi/304717

Atenção especial deve ser dada à foto entitulada "erica frevo", pois depois dizem que eu estou mentindo... mas, como vêem, eu mato a cobra e mostro o pau.

Espero os shout outs, hehe.
Beijocas,
Bíbi

16 novembro 2002

Só um adendo à frase do véio Einstein, homenzinho muy inteligente que era, mas, com licença, eu também sou, e ainda tenho a vantagem de estar viva.
A frase correta seria: "a mente que se abre a uma nova idéia, esta sim terá um tamanho ORIGINAL."

Não acham? (risos bobos e infames)
“A mente que se abre a uma nova idéia jamais voltará ao seu tamanho
original.”

Albert Einstein


Vocês acreditam que eu nunca comi um acarajé na minha vida? E acreditam que eu nunca fui a Grumari (uma praia que fica aqui perto da minha casa, que dizem ser ótima, mas nunca me ocorreu de passar ali e conferir)?

Imaginem uma pessoa que nunca presenciou uma enchente: sou eu. Que nunca puxou assunto com um desconhecido, num banco da praça, só para falar uma gracinha e fazê-lo sorrir. Sou eu.

Eu nunca me prestei a acordar e pensar: pára tudo, que hoje vou fazer algo de novo, algo que nunca fiz. Eu nunca fiz isso.

Nunca na vida eu fui a um salão de beleza e pedi que me inventassem algo de diferente, para mudar de visual. Desde que me conheço por gente, meu cabelo cresce, e do mesmo jeito eu corto, e do mesmo jeito cresce de novo, e assim vou sendo a mesma pessoa, com a mesma cara que o espelho já sabe de cor - acho mesmo que nem preciso aparecer na frente dele para que ele me reflita, com todos os meus detalhes antigos e alguns novos que surgem, não pela minha interferência, mas pelo tempo.

Acreditam que eu nunca subi num palco de rabo-de-cavalo? Em onze anos de palco, todas as vezes que me apresentei eu estava lá, com o cabelo do mesmo jeito. O penteado da lei da gravidade. De novo, sem a minha interferência.

Parece até que eu espero que alguém vá me apresentando as novidades, assim, como num passe de mágica, e eu vá então me adaptando... sem perceber.

Sem perceber, faço 25 anos num domingo ao final de mais um novembro quente, e me dou conta de que tenho me privado do acarajé por esse tempo todo.

Sem perceber, deixei meu rabo-de-cavalo na mão do desconhecido da praça, ou na praia de Grumari, ou em outro qualquer lugar dos muitos em que nunca estive.

Deixei a minha ausência lá, porque estive ocupada demais, presente em minhas já conhecidas manias. Andei envolvida nas mesmas histórias, nas mesmas lamúrias e em algumas ilusões que calharam de acontecer na realidade. E eu me assustei, claro.

O novo vem com sotaque estrangeiro, e a gente fica como bobo, fazendo mímica, tentando compreendê-lo... sem saber que ele veio justamente para nos tornar poliglotas, e não para que o façamos aprender a nossa língua. (Que sentido haveria?)
Com vontade de dar uma invertida, trocar de tom, de pele, de fala ou de gesto. Achar uma moça que não sou eu, por aí, dando bandeira na rua, e aprender a sê-la, só para experimentar. Chutar um balde, sentar numa pedra.

Quem me conhece sabe que sou exagerada e me atravesso no tempo, de modo que declaro aberta a minha temporada de “crise dos 30”, antes mesmo de completar 25.

Durma-se, com um barulho desses.

Aceito sugestões de coisas que nunca fiz, prometo analisar com carinho as propostas. A propósito, quem é que vai me levar para comer o tal acarajé? (Se é que isso existe mesmo, porque eu nunca vi, desconfio de tudo que é novo, estou sempre com um pé atrás, e desafio quem não me dê razão.)

Mas essa parte da arrogância a gente deixa para a crise dos 50, tá bom??
Até lá, aturem-me assim mesmo.
Se quiserem!! Se quiserem!!!

14 novembro 2002

Nem conto a vocês: acabou a TPM.

Estou feliz como pinto no lixo. Vem chegando o verão, como já dizia a Marina Lima, nos bons tempos em que eu era só uma criança que se achava adulta – e não o contrário, como agora.

Vou contar uns causos. Aprendi a ler e a escrever com meu irmão (e guru). Um dia, minha mãe pediu a ele que não esclarecesse minhas dúvidas ortográficas tão prontamente; que eu deveria aprender a pensar, descobrir se casa era com “s” ou com “z” por via de meu próprio raciocínio.

- Mano, casa é com “s” ou com “z”? – perguntei, certa feita.

- Você acha que é com “s” ou com “z”? – ele questionou.

- Não sei, Mano! Me responde!

- Não posso responder.

- Pode, sim, responde!

- Está bem, é simples: se você quer que seja com “s”, então será. Se quiser que seja com “z”, assim será também. Você tem de escrever como pensa que deve ser!!

Fiz uma cara de surpresa-abobalhada-meio-desconfiada que ele não deve ter entendido por anos; até que, já adolescente, confessei que aquele momento fora, para mim, verdadeira iniciação espiritual.

Lembro-me, como se fosse ontem, de ter pensado: “Uauu!! Se o Mano diz que ‘casa’ se escreve como EU quiser, então quer dizer que tudo que EU quiser se tornará realidade!! Logo, EU SOU DEUS!!!”

Sim, porque minha avó dizia, sempre que podia, que Deus era todo-poderoso: o único ser a quem o universo ouvia e respondia sempre com obediência.

A partir daquela revelação precoce, eu saía pela casa, com um sorrisinho de canto, decretando normas secretas e dando ordens explícitas aos anjos – sempre com muito cuidado, é claro, para que ninguém percebesse meus superpoderes divinos. Poderiam se sentir diminuídos perante a minha magnitude, ou mesmo temer futuros castigos (minha avó também dizia que Deus castigava, mas eu ainda sequer havia estudado esse capítulo, o de como castigar).

Não. Não era isso que eu queria. Queria só respeito e amor dos próximos a mim-Deus. (Pelo que eu entendia, os “próximos” eram todos aqueles que não eram Deus; ou, por outra: todos os outros - que não Eu. Por isso se chamavam “próximos”, porque eram os próximos a partir de mim – Deus.)

Não sei se me fiz entender.

E assim fui seguindo, certa de que faria milagres com um pé nas costas, e ajudaria a quem necessitado estivesse, contanto que me prestassem a obediência devida e, volta e meia, acendessem uma vela em Meu nome.

Caí do cavalo quando o meu primeiro pretendente – era eu quem o pretendia! -, uns vinte e cinco anos mais velho que eu, casado e com três filhas, não fez menção alguma de me atender quando, confiante, ordenei: APAIXONA-TE OU MORRERÁS!!!

Nem uma coisa, nem outra.

Como Deus, eu era um fracasso. Caí na maior fossa, vivia arrasada pelos cantos, mal dormia, mal comia, mal falava. Não rezava. (Rezar a quem?)

Aí foi que eu caí na real, resolvendo: de duas, uma. Ou eu não dou Deus, ou o Bicho Homem é que é o Diabo.

Claro que fiquei com a segunda opção.

;oP
Oi.
Meu cabelo acordou esquisito, minhas olheiras se elevaram à décima potência, minha pele está oleosa demais nuns lugares e seca demais noutros, minha orelha amanheceu inflamada por causa do diacho do segundo brinco, levantei meio manca da perna esquerda, os dentes amarelaram, o tempo está úmido, o ar está pegajoso, o assobio do vento está fora do tom, as árvores estão balançando sem o devido gingado, os carros passam mais nervosos do que nunca, parecem atrasados, as pessoas estão todas com cara feia, e cara feia pra mim é fome, por falar em fome, o nhoque apodreceu, o frango assado acabou, a tele-entrega de pizza demora muito, falta água potável em casa, tenho sede e pressa e fome e fúria, me arrasto pela casa, pesada e lerda, penso coisas desconexas, falo sozinha, xingo minha falta de sanidade mental, tento me espreguiçar, dou com a mão na quina do armário, grito, corro ao banheiro, abro a torneira, o telefone toca, corro, atendo, não, não quero assinar revista nenhuma, e não interessa o motivo, desligo na cara da moça, ligo a TV, assalto, acidente, traficante, desligo rápido, vou até a sacada, olho para baixo, miro uma moça com uma barriga imensa, quase parindo, e um vestidinho florido, parece feliz, a desgraçada, é claro: QUEM NÃO FICARIA FELIZ DEPOIS DE NOVE MESES SEM TPM ?????

11 novembro 2002

Buenas !!

Espero que estejam todos na boa. O show de sábado foi, digamos, cansativo. Aquela coisa de bar, tocamos das 9:30 às 3h da manhã, com alguns intervalos para esfriar os dedos e as cordas. Bar lotado, animado, e tal.

Mas o ponto alto da noite ficou por conta da minha cunhada Erica, aniversariante do dia, que levou uma penca de amigos para lá, e acabou “pagando o maior mico” – segundo ela. Mentira. Esteve ótima, dançando frevo.

Explico: Erica foi chamada, de última hora, na semana passada, para dançar frevo num hotel chiquérrimo aqui do Rio... adivinha para quem? Para os gringos, claro!

(Vocês já sentiram que todo mundo entrou pelo cano com essa dos gringos, né? Hehe, o que a gente não faz pelo leitinho das crianças.)

O evento era de responsabilidade da A L Eventos & Multimídia, empresa da qual meu irmão é sócio-fundador-produtor, etc. Na hora do frevo, eis que a moça contratada deu problema, e não havia outra disponível a pagar um mic..., digo, dançar frevo para os gringos, com sombrinha colorida, roupinha, maquiagem, e um bofe bailarino do lado. Mó micão, enfim, sejamos francos.

Quem foi solicitada? Ela mesma. A morena mais bela do Rio de Janeiro (não sou eu nem meu irmão quem diz, não, os gringos saíram no lucro e aprovaram!!), Erica. Tal fosse uma bailarina profissional, foi ensaiar uns passos com o bofe – que, aliás, é dono de uma academia de dança em Copacabana. E o bofe aprovou o gingado da morena. Quem não aprovaria?

Deram-se as mãos, e foram ao saguão abafar. Dizem que Erica terminou a noite com a boca que era um cabide, de tanto sorrir para as câmeras dos gringos, e com o polegar dolorido, de tanto beliscar os gringos mais animados que se aproveitavam do momento “flash” para conferir mais de perto o doce balanço da morenaça.

Fama adquirida, fama sofrida.

Nós, que não somos bobos nem nada, fizemos o esforço de aprender a tocar aquele frevo mais conhecido de todos, e paramos o show no momento mais animado para homenagear a aniversariante, convidando-a para fazer uma apresentação aos amigos.

A morena tropicana, alheia àquela sacanagem toda, viu-se tímida pela primeira vez – creio eu – em sua agitada vida. Um amigo sacou a sombrinha colorida (que conseguimos emprestada com o próprio bofe do frevo) e lhe ofereceu, num gesto tão convincente que a pobrezinha não teve alternativa: quando viu, já estava empunhando o instrumento da dança, em pé, com aquele povo todo em coro: DANÇA! DANÇA!

Eu, num impulso de cunhada-típica-venenosa, fazia um discurso inflamado ao microfone, exaltando as qualidades da bailarina, e oferecendo seus serviços aos possíveis contratantes. E o povo: DANÇA! DANÇA! – que sombrinha no dos outros é refresco, claro.

O frevo rolava solto, e, lá pelas tantas, Erica deve ter pensado que ficaria mais feio fixar raízes no chão que, enfim, saciar a sede dos afoitos. Foi então que se despiu de vergonha, e encarou a frente do palco, onde saltitava, exuberante, arrancando fervorosos aplausos de todos os freqüentadores do bar. Era a glória. (A minha, pelo menos).

O resto do show foi até chocho, se comparado à apresentação que transformou a Ana Lógica em trio-elétrico por alguns minutos, aliás, coisa que era um sonho antigo. Sobretudo, eu evitava o olhar ameaçador daquela que bailara, morrendo de medo de descer daquele palco e ter meu estômago perfurado por um salto dourado.

Tudo está sob controle, pelo menos até agora, muito embora eu ainda ande um tanto cabreira, sentindo que paira uma atmosfera esquisita pelos corredores da minha própria casa. Não sei, não, é capaz de eu amanhecer, qualquer dia, com uma sombrinha entalada na garganta (na melhor das hipóteses).

Notem que esta publicação é praticamente uma carta-denúncia, ou a crônica da morte anunciada. Se eu sofrer algum mal, vocês já sabem.

(E, se ela fugir, procurem no Recife. Onde mais ganharia a vida??)

09 novembro 2002

Oi, queridos, só passei aqui para deixar o convite: hoje, sábado, tem Ana Lógica no Downtown (Espírito do Chopp), a partir das 21h. O pessoal do Rio poderia bem fazer uma forcinha e aparecer por lá para prestigiar esta relapsa blogueira que vos escreve, não é?

Prometo que não irão se arrepender... pois o chopp realmente é muito bom. Hehe.
Beijos.

04 novembro 2002

É o tal negócio.

A gente começa a dar intimidade, fazer política de boa vizinhança virtual, e dá nisso. Pequenos movimentos organizados vão se formando, aqui e ali, como quem não quer nada. Eu, que não sou boba, desconfio.

Não é de hoje que venho notando que essas exigências de novos textos no blog têm passado de brincadeirinhas à toa, implicâncias carinhosas, mimo cibernético. Nada disso. Basta perceber que, outro dia, o nosso mural de recados – que já virou a casa da mãe Joana, diga-se passagem – simplesmente bateu o recorde: onze mensagens. Tudo por conta das organizações desse tal de MST (Movimento dos Sem Texto).

Daqui a pouco, estou até vendo, vão querer ditar os tópicos: escreva sobre isso! Escreva sobre aquilo! Eu vi o fulano na TV dizendo tal coisa, escreva sobre ele! Escreva sobre o seu pânico de pés descalços! Escreva sobre a onda que se ergueu no mar! Afinal, que fim levou a feira, o vestido, o Capitão Rodrigo, a pelada na praia e o carnaval?

Aqui pra vocês!

Eu que mando nessa bodega virtual, ou não me chamo Bíbi Da Pieve, com acento no primeiro “i”.

E, por falar em bodega, minha cunhada Erica (assim, sem acento mesmo, culpa da dona Maria, mãe dela, que tem por hábito sumir cinco dias sem dar notícias, e depois voltar, na maior cara deslavada, ainda convidar pra comer peixe na casa dela e tudo... me perdi nos parênteses, sempre faço isso).

E, por falar em bodega, minha cunhada Erica mandou que eu escrevesse aqui sobre o meu jogo de bilhar – citado por ela no mural de recados, dia desses. Está bem, eu explico.

Antes que a pequena comunidade aqui formada vá pensando que sou freqüentadora assídua de botequins no maior estilo “pé-sujo”, que fico enchendo a cara até as 4h da manhã e jogando bilhar com o Mario do Boné, o Zé Pascoal e o Bola Oito, esclareço: não é nada disso. Aninha, acalme-se. Ainda não cheguei a esse ponto.

O referido “jogo de bilhar” nada mais é do que um código de família. Nós usamos, cá entre paredes, a expressão “jogar bilhar” para o ato de trabalhar com música – o que mais faço, como todos sabem.

Mas o que tem a ver? – irão questionar.

Simples, minha gente. O jogo de bilhar consiste em encaçapar sete bolinhas. Como todos sabem, a música é representada graficamente por bolinhas (as notinhas no pentagrama, já viram?, lembram-se do caderno de música? – pois então).

Curiosamente, são sete as bolinhas do bilhar, exatamente como: DÓ, RÉ, MI, FÁ, SOL, LÁ e SI.

Eis a explicação para a minha mania de “jogar bilhar” – ou seja, fazer música, pois estou atarefada até os cabelos com essa história de tocar para 200 gringos amanhã, e depois tocar cinco horas a fio, num bar, sábado à noite.

Satisfeitos?

É por isso que tenho escrito pouco. Não que eu deva explicações (droga!, viram só?, vocês acabam me confundindo!!!), mas, só para constar mesmo.

Tchau, vou “jogar bilhar”...

02 novembro 2002

Eles vão te pegar!


Não sei se já notaram, mas o tempo do fulano "ficar" com a fulana já é coisa do passado. Atualmente, os fulanos “pegam” as fulanas, e - o que é ainda mais animador! - as fulanas também pegam os fulanos.

É um tal de pegue-se quem puder, e o critério há muito também não aparece como protagonista da trama. É só um mero detalhe. O importante é pegar.

“Pegar” refere-se ao ato de beijar alguém na boca, sem compromisso, e depois experimentar algum tipo de relação sexual com a pessoa. Também "sem compromisso" - como diria o vendedor de cangas na beira da praia, na tentativa de lhe vender uma peça. E a intimidade entre os “pegantes” também regula com a que você tem com o vendedor de cangas.

Por relação sexual, hoje em dia, entende-se uma vasta gama de possibilidades. Já não se mostra eficaz o termo "ir para a cama", porque o local da “pegação” é o de menos.

Também não se pode fazer nenhuma alusão à posição horizontal, outrora a principal evidência de sexo entre duas pessoas, porque as criaturas andam se pegando em diversas posições, das estapafúrdias às inimaginárias, da criatividade ao verdadeiro contorcionismo. O motivo do “pegar diferente” está estampado, geralmente, nas revistas femininas, onde a sacanagem (com perdão do termo) aparece revestida de pomposas explicações psicológicas - "investir na relação" e "sair da rotina" são dois dos principais disfarces para a pegação, digamos, não ortodoxa.

Tampouco o pegar fica limitado à quantidade de indivíduos envolvidos no ato. Percebo que a multiplicidade sexual, se é que existe o termo, está cada vez mais presente entre os seres. Eu diria "casais", mas eis que também esse termo já soa obsoleto, pela conotação de gênero - um masculino e um feminino - que, tenho observado, cheira a poeira do século passado.

Uma vez extrapolados os limites de gênero, número e grau, há dois modos pelos quais podemos interpretar a nova atitude sexual dos seres humanos. O primeiro é otimista e romântico, além de quase religioso (do termo religare, lembram?): talvez estejamos passando por uma fase de descoberta universal, e, muito em breve, o amor não conhecerá fronteira de espécie alguma. Amaremos ao próximo, e ao seguinte, e ao seguinte, e ao seguinte - um passinho à frente, por favor. Olha que já estamos quase lá.

O outro modo de interpretação, não tão romântico – mas tão divertido quanto – sugere que essa pegação desenfreada entre os homens (exclua o gênero, claro) se trata mesmo de uma imensa PEGARIA – substantivo que surge da junção entre os termos “pegação” e algum outro que comece com “p” e termine em “utaria”.

De qualquer maneira, vale o alerta: se ficar, o bicho pega. E, se correr, o bicho come – o que dá no mesmo. Salvo pormenores da terminologia sexual e/ou anatômica, tanto faz se você é homem, mulher, moça, velha ou coisa que o valha: fatalmente, você tem algo que interessa a quem pega. E eles vão te pegar.

Caso queira se abster da “pegaria” vigente, um único conselho: cuide bem do seu. E depois não diga que eu não avisei.


29 outubro 2002

Os cientistas descobriram, com quase 100% de certeza (vai saber o que é isso), que existe, no centro da Via Láctea – galáxia da qual nosso rico planeta faz parte -, um imenso buraco negro que funciona como um redemoinho, sugando os corpos sólidos para dentro de si.

Ou seja, a Via Láctea tem um ralo. E já puxaram a tampa.

Mas a Terra não corre risco de entrar pelo cano, segundo eles, porque estamos muito afastados do buraco. Devemos suspirar aliviados, portanto.

Eu fico a pensar, inevitavelmente, no paralelo que pode se traçado entre a galáxia – ou seja o que for – e as nossas próprias entranhas. Somos poeira cósmica, está correto, mas alguma função aqui nós devemos ter.

Estamos longe demais do ralo da pia gigante, mas temos nossas próprias piazinhas, e nossos redemoinhos também não são de se jogar fora. Com todo respeito à Via Láctea, a vida terrestre já dá trabalho suficiente, de modo que não vou me preocupar com o encanamento da galáxia. Já seria demais.

O meu problema, por enquanto, é achar o tom correto para a canção. E isso pode ser muito complicado, tão complicado quanto me equilibrar na dança cósmica dos planetas, cuidando para não resvalar.

Se eu não fosse tão careta e covarde, ouviria o vento dos meus ralos internos assobiando, e seguiria aquele tom, ainda que não soasse exatamente como eu gostaria. O tom da intuição, à sombra da razão, que sempre canta os mesmos versos... mas eu finjo que não escuto.

E você não vá tirando o seu da reta, porque – tenho certeza – é igualzinho a mim. Ou quase.

Ah, mas a esperança equilibrista... é a última que entra pelo cano.

Será que estamos girando para algum sentido, ou só estamos correndo em volta do rabo? Eu voto no sentido, mas, volta e meia, volta o rabo e me derruba no chão. Complicado. (Ninguém disse que seria fácil. Simples, eles me dizem a toda hora. Mas, fácil... não).

Quando eu me sinto girando ralo abaixo - é quando estou encucada com dívidas, dando voltas em torno das mesmas dúvidas, achando que me falta talento, que envelheço e me desoriento cada vez mais e mais. É quando me pego fazendo contas nas pontas dos dedos, mesquinharia de sentimentos, quando me esqueço de abraçar meu irmão, por exemplo, e durmo pensando que estou só (mentira, estamos todos girando juntos).

Eu me sinto ralo adentro quando penso em medir emoções, catalogar os endereços dos beijos que me dão, com medo de dobrar a próxima esquina sem uma segurança, sem uma garantia qualquer, sem um papel, sem nada, sem nada. E, cada vez em que grudo as etiquetas nos vidros, eu me esqueço do verdadeiro sabor que eles tinham. A burocracia evapora o conteúdo.

Quando eu me sinto girando para o alto – é quando me desapego, eu me despeço dos medos, não quero saber das minhas convicções. É quando dou a mão ao simples, ao óbvio, quando me permito o ócio, e me entrego ao coração. Sem culpa, sem mania de perfeição.

Eu giro para dentro do ralo quando passo horas discursando sobre qualquer coisa, e me dói o peito enquanto tento ser verdadeira, mas não consigo.
Eu giro para fora do ralo quando, em vez de discursar, percebo que todo texto do mundo cabe todo dentro de um gesto.

E a Via Láctea vem parar bem no meio das minhas duas mãos.

27 outubro 2002

VOTOS DE UM BOM DOMINGO DE BONS VOTOS


Estou só escrevendo para aqueles choramingões que reclamam que visitam meu Blog três a quatro vezes por dia, no afã de encontrar novidades, e se decepcionam ao verem posts "antigos" - ante-ontem, para vocês, já é antigo.

A biblogueira aqui faz outras coisas da vida, caso não saibam, e não pode vir dar o ar de sua graça de cinco em cinco minutos, ok? Vocês bem que poderiam se organizar, fazer tipo academia: visitarei o BiBlog três vezes por semana, assim que acordar, e pronto.

O BiBlog não deixa a bunda durinha, mas diverte um pouco mais, e também é cultura. Estamos aqui cuidando da nossa saúde, afinal, quem ainda não leu sobre os benefícios do riso?

Estamos combinados, então? (Garanto que não...)

Deixo votos de bom domingo, e não se esqueçam de levar o título.

Beijinhos d'eu.

26 outubro 2002

Bons dias!

O pessoal do Rio já vai aprontando a caravana, que estaremos tocando no Espírito do Chpp – shopping Downtown -, no dia 9 de novembro, sábado. A “parada” (como se referem os cariocas a QUALQUER coisa, seja viva ou morta, real ou imaginária, etc) começa por volta das 9h da noite, e extrapola todos os limites do bom senso e da solidariedade com quem usa um contrabaixo pesado pendurado no pescoço, esticando-se até as 3h da manhã. Creiam vocês ou não, assim está determinado, e assim faremos.

Não contem comigo para nada no dia 10 de novembro, portanto. Estarei, com toda certeza, aboletada nos meus aposentos, imaginando uma luz violeta entrando pelo meu chakra frontal (ou terceiro olho), incenso aceso, inspirando e expirando lentamente, e só abrindo a boca para entoar canção de uma nota só, aquela que diz assim: “OOOOooooommmmmmmmm...”

E, por falar em saudade, onde anda você?

Antes disso, no dia 4, farei um violão-e-voz chiquérrimo, num evento para 200 gringos, onde cantarei baladas melosas e alguma coisa de bossa, o que me permitir o conhecimento harmônico e, sobretudo, os dedos. Entre uma canção e outra, encherei a boca para dizer: “Welcome to Rio” – e está feita a saudação da noite, que não esperem mais nada do meu inglês tupiniquim, porque já faz anos que não estudo, e prefiro silenciar a deixar escapar um mico qualquer.

E prefiro que não me aplaudam, porque o meu “THANK YOU” já está mais para TÊM-KIU, de tão enferrujada a minha prática no idioma.

Pois é, amanhã é o dia “D”, e eu vou justificar o voto, ou seja, a ausência dele. Há quase cinco anos morando nesta cidade, vergonhosamente ainda não regularizei minha situação de eleitora, de modo que apenas me abstenho e ainda assino embaixo, na cara dura mesmo.

A gente nunca sabe quando algo é definitivo. Deve ser porque nada o é. Minha vontade é casar e ter o Breno (filho) aqui no Rio de Janeiro mesmo, mas não sei se o Capitão Rodrigo (marido) vai amarrar o cavalo num poste carioca, ou se vai preferir se ausentar da minha vida nesta encarnação, e me aparecer, na próxima, irreconhecível – talvez gay, inclusive. A gente nunca sabe.

Até agora, garanto a vocês que os capitães (bela palavra!) da minha vida não têm sido, nem lá muito capitães, nem tampouco Rodrigos. E o cavalo branco, que é bom, nem sinal dele.

Já cruzei com belos moços, sim, mas, no decorrer da história, revelavam-se portadores de pangarés mixurucas, ou seja: eram falsos Rodrigos, evidente. E aí não me serve.

O Rodrigo tem de ser original de fábrica, do bom mesmo, com cavalo incluído, furinho no queixo, boca grande e alguma sensibilidade. Do contrário, não quero nem conversa.

Dizem as más línguas que sou uma sagitariana arrogante, metida a besta e até seletiva demais, mas eu não acho que a crítica tenha fundamento. Ocorre que, até o presente momento, nenhum Rodrigo que se preze cruzou meu caminho.

Um ou outro até cruzou, mas não me convidou para a cavalgada.

Na certa, esqueceu-se. E vai ligar mais tarde.

23 outubro 2002

ESTRADA

A estrada que somos na tempestade, a estrada que temos nas veias, a estrada que tece a arte, a estrada de Deus e do diabo a quatro - onde tudo se registra, onde tudo se alcança com sonho e alguma pegada; onde tudo aqui fica, mas também tudo lá passa.

A estrada das migalhas de pão de João e Maria - ilusão de retorno -, a estradinha de papel do primeiro caderno - ilusão de adorno. A estrada imaginária que sai da casinha e leva ao lago, convencional e bidimensional infância, sem ganância, ainda sem aquela ânsia do preto no branco racional.

A estrada giz-de-cera, aquela curva colorida certeira - o ponto de partida ideal.

A estrada que para dentro se embrenha - a estrada-entranha -, uma senha abstrata e estranha do interno de todos nós. A estrada a sós, eterna montanha-russa sem trilhos, vida, ida, vinda, ida, vinda - inferno e céu.

A estrada-trajetória do tiro, a estrada-história da guerra, a estrada-suicídio abismo: a droga.

E a estrada-folga, a pausa; à beira da certeza, a surpresa desagrada: causa errada.

A estrada se contorna, mas não se retorna. A estrada se torce, mas não se move. A estrada se passa, não se pára; não se sabe se terra, se barro, se pedra – nunca se sabe se a estrada é pronta, porque a estrada não se pensa, e não se espera nada.

A estrada é a recompensa.
AOS BIBLOGUEIROS CONVICTOS - e aos nem tanto

NÃO deixem de dar uma passadinha no belo site desenvolvido pela artista ANA PELUSO - www.officinadopensamento.com.br

Estou lá, na coluna musical.
Beijos.

22 outubro 2002

Sempre acho que vou acordar, um dia, com o barulho da chuva, virar de lado e puxar um pouco mais o edredom, sentir o cheiro do chá de erva-doce que ele vem trazendo devagar, com biscoito integral e mel e um sorriso bobo que eu sempre vejo, e sempre me encanta, mas nunca sei dizer o próximo compasso daquela sempre mesma situação que cisma em acabar diferente a cada chuva, a cada chá e a cada beijo integral com mel.

Eu me desligo das coisas como são, e me detenho às coisas como SER.

A chuva é água, mas o ser da chuva é muito mais; o ser da chuva é o barulho e é o gosto e sou eu mesma, enquanto mulher, enquanto mundo e como chuva ser.

O chá também foge da erva que é, e vem ser aqui no vapor do hálito dele, e no meu calor, e no orvalho do amanhecer chá.

Assim é que tudo perde o sentido e ganha os sentidos, assim é que o doce vem antes do mel, o barulhinho é o pai da chuva, o vaporzinho é que tem o chá – e não o contrário -, tal como o amor nos tem, não pelo poder, nem por assim dizer, mas simplesmente pelo nosso próprio SER.

20 outubro 2002

EU, SEM BOLA

Boa tarde, moçada. O Rio de Janeiro está escaldante, e dizem que, no sul, chove que Deus manda. Aqui Deus manda nas eleições, e o chifrudo manda no tráfico. Mas isto não interessa no momento, vim falar de coisas boas, estou de muito bom humor, e o Mano já está chegando com o sorvete mesmo.

Passo na praia e morro de vontade de jogar BOLA - poderia ser vôlei ou futebol -, mas me falta a companhia. Vejam como uma sagitariana com mania de auto-suficiência pode quase tudo na vida, mas, o mais importante, não pode: jogar BOLA. Ando com esta fixação. Não estranhem se me virem, dia desses, a jogar BOLA na parede, empolgada e saltitante, ainda gritando “deixa que eu chuto!!!” e xingando a mãe do juiz.

As pessoas que eu conheço não jogam BOLA, e isto me deixa assim, a me sentir só, acorrentada a um futuro meio insosso, um futuro sem BOLA e sem apito. Imaginem uma pessoa que não pode jogar BOLA. Esta sou eu.

Outra, outra da solidão. Lembram-se do show do Pepeu, sim? Pois trouxe, do bar, vários papeizinhos – guardanapos, na verdade -, que me serviam de conforto enquanto o Pepeu não aparecia para cantar que também queria beijar. (A propósito, já descrevi aqui a BOCA do Pepeu? Só de pensar, já me esqueci dessa besteira de jogar BOLA. Há tanta coisa melhor por aí, ora, bolas!).

Transcrevo, aqui, fielmente alguns dos meus rabiscos daquela noite solitária:

Guardanapo UM:

Essa gente da arte é que paga o pato
é quem sofre o impacto
e, se pisa em falso, não se cansa:
segue reto, certa de que a vida
não carece de convicção.
Com a graça de Deus,
À fé não interessa razão.


Guardanapo DOIS:

Essa gente da arte é de pouco papo
é quem sente o atrito
e, se vê o perigo, não se assusta:
segue em frente, certa de que a vida
desconhece a previsão.
Com a graça da fé,
a Deus não interessa razão.

Guardanapo TRÊS:
Uma menina com a cara e o jeito da Melissinha na produção de um show... é BÁSICO. Se não houver, boa coisa não é.

Guardanapo QUATRO:

Escrever é como dialogar com as próprias entranhas, com a vantagem de que elas não têm direito de resposta. (Ou será que têm?).
O que está entre parênteses é de autoria das entranhas, evidente.

Guardanapo CINCO:

Todo artista tem uma dívida que não será sanada nesta vida.

Guardanapo SEIS:

O perigo do verso não é o conteúdo, mas os filhos que o conteúdo jogará no mundo, irresponsavelmente.

Guardanapo SETE:

Nada há de mais romântico, no mundo, que um baixista semi-careca, vestindo preto desbotado, a dedilhar melodias inusitadas, apaixonadamente, jamais desrespeitando a HARMONIA. (AMORnia?)
Olha as entranhas, olha as entranhas...


Era isso, por hoje. Vou ao sorvete, beijocas geladas a todos e a todas que me aturam virtualmente.

18 outubro 2002

PEPEU E EU NA BARRA – eu também quero beijar!



Ninguém quis ir comigo ao show do Pepeu Gomes, ontem. Num rompante de mulher moderna e independente, tomei meu moderno banho, enfiei minha moderna roupa, peguei meu Bibimóvel e rumei para a Barra. Eu vou só.

O show estava marcado para as 21:30, num bar/restaurante chamado República Gourmet – já muito freqüentei, toquei, etc. Chego lá antes das 21h, e consigo vaga bem em frente. Mal termino de estacionar, o flanela dá um grito. Puxo o freio de mão, e pergunto: desculpe, o que disse?

- Eu só mandei a senhora não ir mais pra frente, que senão ia arrebentar a frente do carro na mureta!!! – Ele me responde, num mau-humor absurdo, ainda gritando, como quem me xinga por, talvez, querer bater meu próprio carro num muro (?).

- Ah, muito obrigada, mas não se preocupe, que eu sei o que estou fazendo.

- Mas ficou DOIS DEDOS da mureta!! – Ele rebate, mostrando a distância com os dedos.

- Eu sei, meu anjo. Problema seria se tivesse ficado dois dedos para dentro da mureta, não acha?

Ele se complicou para responder, acho que não entendeu. Entrei no bar.

Pepeu e banda só começaram depois das 23h – o que achei um desrespeito, mas tudo bem. Perdoado estava o novo baiano, que já começava cantando “eu também quero beijar”, com a boca imensa, o cabelo preso, a língua presa, e o charme solto que só.

(Aqui vai um parêntese: às moças que acham o Pepeu Gomes feio que é um raio, já vou logo admitindo que não sou exatamente conhecida pelo meu bom gosto estético, o que é uma pena, mas nada posso fazer. Acho o Pepeu mais bonito, autêntico, swingado, sexy e irreverentemente mais interessante do que o aguado e azulado Mel Gibson, por exemplo).

Atributos físicos à parte, musicalmente o garoto-cinqüentão também agrada, e muito. Também por “eu só quero você e mais nada” (falsete preciso e um pouco estridente no “e mais nada”, como lhe convém), mas, sobretudo, pelas seis cordas muito bem tocadas - com elegância e segurança de quem sabe o que está fazendo.

O que me chama atenção no instrumental bem entrosado da banda é a brasilidade muito bem casada com o “peso” quase “duro” (no sentido de forte) – aquele que é facilmente perceptível nas boas bandas de rock’n roll, por exemplo. Pepeu é roqueiro com swing, consegue ser HARD e BALANÇO ao mesmo tempo. Empolga e impressiona.

Toca choro com guitarra distorcida e faz convenções inusitadas, sempre com muito bom senso, e sem rompantes exagerados. Tudo como manda o figurino, eu diria.

O final ficou aquela coisa meio “sai do chão, galera”, apelando para a manjadinha “ora bolas, não me amole com esse papo de emprego” – particularmente, acho desnecessária e fracote das pernas, mas o povo gosta e aprova, levantando e dançando ao redor das mesas. Aplaudo também. (Quem sou eu?)

Os destaques do público foram mesmo as três filhas do Pepeu – as meninas têm um grupo de dança que canta, ou um grupo de canto que dança, não sei bem, vocês lembram? É algo como KLB, mas com as letras delas. Cada qual com a carinha da Baby, mas a cor do cabelo é o que diferencia. Todos fluorescentes, mas cada qual num tom... fluorescente.

E o pessoal do FAMA (não sei qual versão do programa, mas havia um bocado deles) também estava numa das mesas da frente.

P.S.: Ah, sim. Minha mãe, no primeiro dia em que passeava aqui pelo Barrashopping, deu de cara com o Pepeu Gomes e exclamou: NOSSA! Que cara parecido com o Pepeu Gomes!!

“Mãe, este É o Pepeu Gomes”.

“Credo, minha filha, mas como está FEIO !!!”

Logo, não tenho por quem puxar.

17 outubro 2002

APELO AOS NAVEGANTES

De todos os apelos que fá fiz, o que se segue é o mais imporante: ESQUEÇAM, pelo amor de Deus, que eu escrevi a pérola
"(...)pois que escolhi vim logo parar debaixo do braço do Redentor".

Foi erro de digitação, vamos dizer assim. O calor, enfim. Sei lá. Escolhi VIR. VIR, VIR, VIR.
Jamais escolhi VIM.
Desse jeito, não vou VIM a lugar algum. Argh.

16 outubro 2002

Alou, macacada.
Em casa, já recebi críticas rígidas em relação ao meu fraco desempenho aqui no BiBlog nos últimos dias.
Culpo o calor e a (conseqüente) falta de inspiração. Pode ser?

Não se vive mais no Rio de Janeiro; derrete-se, aqui, dia após dia. Hoje eu fui dar uma caminhadela na praia, à noite. À noite! Suava em bicas. Vento nenhum. Até o mar, acostumado que deve estar às temperaturas exageradas desta cidade, pareceu-me suspirar de calor – posto que as ondas, cá de longe, pareciam-me mesmo velhas baianas, com seus vestidos rodados de espuma branca, a balançarem, em suas redes, para um lado e outro, com a lua na cabeça e alguma preguiça justa no coração.

Eu digo justa, sim, porque “o calor vem desumano” – como cantam Djavan e Cássia -, e ninguém merece movimento algum, por estes dias, que não seja o vaivém ondulatório, ou pendular, ou qualquer outro vaivém que vocês imaginem aí em suas mentes sujas, mas depois não me venham dizer que a pervertida aqui sou eu!

Na calada da noite, só para variar um pouco, os bandidos metralham os prédios públicos e detonam bombas nos shoppings da cidade. O tal Palácio Guanabara está virado num queijo suíço, e não é de hoje que os traficas andam planejando transformar a cidade maravilhosa em Tábua de Tiro-ao-Álvaro – não tem mais onde furar.

Mas, para não dizer que não falei das flores, nossa futura governadora, Rosinha Garotinho, não poderia ter nome artístico mais apropriado aos cidadãos que temem pelo futuro disto aqui. Rosinha Garotinho: uma flor e uma criança – oh, quanta esperança.

Deve soar mesmo esperançoso à maioria da população, pois a moça está eleita, de fato, e nada mais se pode fazer. A não ser, é claro, reclamar para o bispo.

Mudando de assunto - até para não terminar tão doce quanto limão estragado -, hoje eu comi um feijãozinho caseiro que lembrou minha Vó Manoela, mãe de meu pai, já falecida. Foi com ela que aprendi a rezar, quando ainda achava que Ave Maria era, realmente, alguma parenta das galinhas, pombas e patas que minha vó criava no sítio. Eu achava uma ótima piada: “Ave Maria, cheia de graça”. E imaginava, sei lá, uma garça desajeitada, divertida e muito boazinha, que ficava voando lá pelo céu (?), a rogar por nós, agora e na hora de nossa morte, amém.

Mal sabia a Vó Manoela que eu iria precisar tanto dos cuidados da garça-mãe de Deus, pois que escolhi vim logo parar debaixo do braço do Redentor, e, quanta ironia: o cenário aqui anda quase beirando a perfeição daquilo que um dia fora imaginado pelo, desculpe-me a governadora, mas pelo chifrudo mesmo.

Já sei, já sei: era preferível que eu terminasse o texto na acidez do limão que nas guampas do diabo. Mas essas coisas a gente não escolha. (Governadoras, sim).

11 outubro 2002

DOS BICHOS


Não, senhora, meu blog não está entregue aos bichos. Apenas estive atolada de serviço nos últimos dias, de forma que não pude brindá-la com minhas frases tão assiduamente quanto desejaria. Estou perdoada?

Obrigada, senhora.

E como vai seu cabelo vermelho? Tem feito as unhas regularmente? As caminhadas, os abdominais, as redações dos meninos – tudo nos conformes?

Aqui tudo está indo muito bem, fora o calor de rachar e a violência de furar. Nossa sorte é que ainda temos a água de refrescar, a reza de proteger e a poesia de viver. Não fosse isso, minha senhora, a coisa já teria degringolado (palavrinha, aliás, que aprendi com a senhora, nos idos tempos em que ainda me Aninhava nos seus braços).

O almoço que eu fiz ontem lhe causaria sensacional orgulho. Pois não é que temperei a galinha (frango!, depois de morta, a galinha vira frango!) um dia antes, e reservei na geladeira, de modo a “pegar gosto”?

A bichinha agarrou mesmo o gosto do limão e minhas ervas desidratadas! Assei-a, e nos deliciamos com o sabor intenso de uma galinha bem-dormida! Nada como um dia após o outro, já diziam.

Fiz até uns tomates (na verdade, só cortei e temperei), e arroz integral – claro. Meu irmão comeu que se lambuzava, inclusive o tomate! Mas disso não posso falar muito, que depois ele reclama de eu estar expondo sua intimidade.

(Quatro sobre-coxas, ele comeu. Quatro!!! Quem é que dá conta de alimentar esse moço?? Juro que não conto mais nada, ok.)

Meu pai – para mudar o alvo – telefonou, dia desses, contando a novidade: depois de dois meses de espera, finalmente fora buscar a Raíssa (cachorrinha) na escola de adestramento.

Depois de matar a saudade do bichinho, pôs-se a ouvir as instruções do “professor”. O que havia ali não era mais uma reles cadela. Tratava-se, ele desconfiava, de um animal programado, quase como um moderno aparelho “desses de apertar botão”. E ele, até hoje, confessa ter dificuldades em pausar o vídeo para fazer xixi.

A confusão foi ficando grande. O “professor” da Raíssa estava discorrendo, de modo técnico, sobre as novas funções da cachorrinha. Era um verdadeiro manual de instruções. E a Raíssa não tinha controle-remoto, para piorar.

Meu pai saiu de lá completamente zonzo, com tanta informação. E começou a se arrepender no ato.

-Senta! – A Raíssa deitava.

-Levanta! – A Raíssa sentava.

-Pega, pega! – A Raíssa olhava, com cara de tacho. Estática.

E assim foram se desentendendo mutuamente, até que ele resolveu desistir, e tratá-la como se fora um mero cão. Chega desse negócio de adestramento. Cachorro inteligente é história pra boi dormir, esse bicho que se coloque no lugar dele, e pronto.

-E deu certo, pai?

-Nada!! O feitiço virou contra o feiticeiro! Agora, é ela quem manda em mim!! Impressionante! Se eu mando calar a boca, ela late ainda mais alto. Se eu mando deitar, ela pula em cima de mim. Se ela quer comida, tem que ser na hora. Tudo, tudo na horinha em que a madame quer! Já expliquei que, numa relação, cada um tem que ceder um pouco. Pensa que ela deu bola para a minha psicologia de casais? Nem aí! Continuou balançando o rabo, cínica, como se não fosse com ela. Estou cansado, sabe, filha? Não há diálogo, não há respeito. É tudo como ela quer, só a vontade dela impera nesta casa. Está virada numa cadela tirana e sem escrúpulos. Ontem mesmo, eu me peguei seguindo as ordens dela, naturalmente, como se isso fosse a coisa mais normal do mundo. O pior é que a gente acostuma e, depois, quando vê, já está obedecendo mesmo! Era só o que me faltava, mais uma para me dar ordens! JÁ NÃO CHEGA A TUA MÃE??!

07 outubro 2002

PENSA!

Sexta-feira à noite eu fui à Lapa com um amigo. Ele passou aqui em casa, e pegamos a Linha Amarela em direção ao Centro da cidade - eu moro no Recreio, é longe, aqui no Rio as distâncias são sempre grandes.

Lá pelas tantas, pouco antes de pegarmos a Av. Brasil, fomos surpreendidos por carro da polícia - que deu um cavalo-de-pau e se atravessou no meio da pista. Desceram uns 4 ou 5 PMs, cada qual com um fuzil na mão. Um deles disparou um tiro, provavelmente tentando "caçar" ou assustar um bandido que passava por ali na hora.

Meu amigo estava dirigindo, e gritou para que eu me abaixasse, enquanto ele acelerava e tentava nos tirar dali o mais rápido possível.

Cena parecida com essa (mas sem o tiro) eu presenciei, também na Linha Amarela, exatamente na noite anterior.

Fica aqui meu desabafo, acompanhado de um pedido encarecido que se estende a vocês e a quem mais quiser: PENSEM PAZ. Atentem para suas vidas em família e no trabalho, e POLICIEM os PENSAMENTOS o quanto puderem.

Não deixem seus filhos crescerem pensando que o Rambo é o máximo. NÃO incentivem a violência, sobretudo com o PENSAMENTO.

Quando a gente pensa "não posso fazer nada para resolver essa situação", está CONTRIBUNDO para que ela não se resolva. TODOS PODEMOS, e a força está, não na matéria, mas NA IMAGINAÇÃO - por mais incrível que pareça.

Não estou dizendo besteira, meu anjo. De boba, tenho só a cara e o bolso.

A ciência está cada vez mais próxima de compreender certas questões antes desprezadas por ela. INFORMEM-SE; leiam UM parágrafo sobre os princípios da física quântica, antes de considerarem que qualquer papo sobre "o pensamento cria" é balela.

Dêem uma busca, na Internet, pela palavrinha GOSWAMI (é só um mero exemplo). Trata-se de um físico que é doutor no Instituto de Ciências Abstratas em Sausalito, CA. Ele afirma, entre outras coisas, que A CONSCIÊNCIA É A CRIADORA DA REALIDADE FÍSICA.

Está tudo muito perto de nós. É FÁCIL e SIMPLES. Não é A CIDADE que anda violenta, não é o PAÍS, não é o BUSH, não é LÁ - nada é LÁ.

Somos nós - é aqui, bem aqui.

É quando eu penso em ferrar o cara que me ferrou, é quando eu tenho ÓDIO, RAIVA, AGRESSIVIDADE, RANCOR. É dessa matéria-prima que são feitas as bombas. E elas estão estourando cada vez mais perto do nosso nariz.

Nada é tão complicado assim, se eu não for CABEÇA-DURA. É CARETICE não prestar atenção nisso, é RIDÍCULO continuarmos ignorando que a responsabilidade é NOSSA.

Vejam se vocês conseguem beber um gole d'água antes de se imaginarem fazendo isso, mesmo que rapidinho, "quase" de modo mecânico. Se alguém conseguir, dou-lhe minha fortuna toda (hehe).

Não estou pedindo para rezarem a Santo Expedito, nem para fazerem um batuque aqui e ali, nem para meditarem, fazerem jejum, acreditarem em coisa alguma que não esteja com vocês dia e noite. É só PENSAMENTO, é grátis e não morde.

Não é porque está na moda, não é o pensamento dos livros de auto-ajuda. Vão estudar um negócio sério antes de julgar pelos almanaques da vida, não se contentem com a água batendo nas canelas - queiram ir mais fundo, se forem capazes, se não tiverem PREGUIÇA.

Raramente escrevo sobre isso. Vão dizer que devo acabar doida, vendendo incenso em Três Coroas. Capaz de me colocar na prateleira dos "esotéricos".

Mas agora eu escrevo, e ainda mando estudar. Fiquei TOCADA pelas cenas que vi, quero mais é que me achem maluca de pedra, não estou nem aí. O negócio tem que funcionar, não é possível que essa gente CARETA vá continuar batendo sempre nas mesmas teclas. Tacanhice com destino ao crime - passagem só de ida.

Desculpem estar sendo tão enfática; sou meio exagerada, mas só quando decido ser, quando é por boa causa.

Pensem paz, vivam bem... vão cuidar da vida, oras.

Abraços,

Bíbi Da Pieve

04 outubro 2002

YES, WE HAVE BANANAS


Instalaram uma feira aqui ao lado do nosso prédio. É assim que se diz – instalaram uma feira? Não sei. Depois da invasão dos softwares, parece que tudo é de instalar.

Fiquei com preguiça de “fazer a feira” (como os cariocas dizem); ainda não fui. Mas tenho sonhado muito com o dia em que sairei daqui com uma sacolinha no ombro, e tratarei de buscar bananas-prata e maçãs verdes na feira. O que me falta é disposição, mas, em contrapartida, tenho imaginação que dá e sobra.

Estou tratando do figurino. Não sei com que roupa eu vou. Acho que roupa de feira tem de ser meio coloridinha, primaveril, e eu não tenho nada que misture cores, nada de flores, nada, nada. Gosto de cores “burras”, como costumo dizer. Quando compro uma blusa vermelha, é exatamente aquele vermelho que você imagina quando lê escrito: VERMELHO. Bem grande, assim, ignorantão.

Esse negócio de vermelho “puxado para o...” não me convence. Verde é verde, azul é azul, e assim por diante. Minhas cores são assim; honestas, francas.

Agora, para a feira, preciso arrumar um visual de menos impacto. Acho que vou a um brechó comprar um vestidinho de tonalidade duvidosa, sei lá, com florezinhas ou mesmo rabiscos incoerentes de todas as cores desbotadas que eu achar. Um estampado desses que parecem salada mista, cortina de salada mista, algo do gênero.

Sandália. Não posso deixar de comprar uma sandália sem salto-alto, que a gente anda muito na feira. Se bem que, por aqui, temos só três ou quatro barraquinhas. Não importa. O tamanho da feira não pode determinar o traje, senão vira bagunça. Feira é feira, e pronto. Salto baixinho.

O cabelo vai todo preso para cima, até para não atrapalhar no apalpar das frutas. Há que se ter muito cuidado, numa feira, para escolher bem o produto. É básico.

O texto é fácil. Basta reclamar de tudo um pouco, começando pelo tempo, vizinha, que está há dias nessa indecisão, ora chove, ora esquenta, não é? E o preço do morango, então? Quis fazer, noite dessas, uma festinha lá em casa. Festinha particular, entende?, para o maridão, com morangos e chantilly, não sei se estou sendo clara... é, festinha de sacanagem, isso mesmo. Só que não deu, amiga, simplesmente perdi todo entusiasmo ao me deparar com o preço do morango, que já foi mais humilde. Assim, não há sacanagem que resista!

E a vizinha há de comentar que, ontem mesmo, o menino mais novo teve um febrão que foi de preocupar. Banho frio, afinal, é bom? Não sabe. Na dúvida, colocou todos os edredons da família por cima do moleque, que acordou encharcado no meio da madrugada. Mas a febre dele baixou; o problema é que o marido e os outros três, hoje, amanheceram espirrando, porque dormiram destapados. Aí ela teve a idéia de vir buscar uns limões, aproveitou que era dia de feira...

Assim, eu vou fazendo as compras, com meu vestidinho alegre e minha sandália sem graça.

Vou chegar em casa, orgulhosa, colocando as frutas numa fruteira – preciso comprar uma -, por ordem de tamanho ou de chegada ou de cor mesmo. Os legumes, devo empacotar e guardar na gaveta debaixo da geladeira.

Depois, às 11h da manhã, colocarei a couve-flor e uns rabanetes no microondas (deve ser assim que se faz), lerei as instruções na embalagem, e seguirei à risca. Assim que apitar, farei o mesmo com a rúcula, o agrião, os tomates e, sei lá, o pimentão VERMELHO (como a minha blusa).

Quando estiver tudo cozido – será que precisa de água? -, ou assado, não sei como se diz, então eu chamarei a família, colocarei a toalha xadrez por cima da mesa, e uns pratos, e uns copos.

E sairei correndo pela porta dos fundos. (Na verdade, a sandália baixa era pra facilitar a fuga).





03 outubro 2002

Sonhei, amigas, nem pareceu sonho. Lembro ainda agora, com nitidez. Eu estava me preparando para subir ao palco. Era um lugar enorme, estava lotado, tratava-se de uma grande festa – algo como Oktoberfest, eu imagino. Com barraquinhas, muita comida e chope.

Ofereceram um jantarzinho à banda. Sentei-me, e comecei a comer. Lá pelas tantas, engasguei feio, muito feio. Vieram me amparar, o que houve com ela?, mas já era tarde: algum distraído – ou bêbado mesmo – havia deixado cair, naquele strogonoff de camarão delicioso, uma das lentes dos seus óculos de grau.

Eu, de pouca sorte, havia conseguido justamente me servir da conchada que escondia aquela lente. (Detalhe: àquelas alturas, o vidro já estava partido, aos pedaços). Quando fui morder o camarão, tive a ingrata surpresa de mastigar, também, migalhas de lente. Pensando que era areia, fiquei com vergonha: não vou reclamar, prepararam o jantar com muito carinho, mas não limparam o camarão direito. Tudo bem, tudo bem, acontece.

Mastiguei a “areia” todinha, estranhando um pouco aquela consistência, e engoli. Outras garfadas, mais “areia” engolida. Até que, subitamente, apareceu na minha boca um naco maior de vidro. Pensando que poderia ser qualquer objeto estranho, menos óculos, tratei de triturar também, e engolir. Metade entrou; outra metade, cortou minha língua e meus dentes.

Comecei a tossir e a cuspir vidro diante de todos. Foi aquilo.

Quando, enfim, percebi o que havia acontecido, aí foi que as coisas pioraram: parecia que meu estômago estava sendo esquartejado por aquele vidro todo, antes “areia”, que eu tinha ingerido irresponsavelmente.

Fui ao banheiro, correndo, e olhei no espelho. Um dente da frente caiu no chão, assim que abri a boca. Outro, o vizinho daquele, ameaçava pular também. Era o início do suicídio coletivo da minha arcada dentária.

A única coisa em que eu pensava era: e agora?? Como é que vou cantar com este time desfalcado?

Nisso, entram dois homens no banheiro. Um deles é meu amigo cantor; o outro, um baixista que o acompanha.

- O que está havendo? Por que vocês entraram no banheiro feminino?? – Eu disse, assustada e tímida.

Não era o banheiro feminino. O equívoco fora meu, que, aloprada e semidesdentada, tinha invadido o sanitário deles.

Foi então que me caiu a ficha: “O que vocês vieram fazer nesta festa?”

Tinham ido me ver tocar. Mas já estavam indo embora, porque ouviram um boato lá fora – que a baixista tinha passado mal por causa de excesso de álcool, e fora carregada, muito a contra-gosto, para o Pronto-Socorro mais próximo. Glicose na veia, aquelas coisas.

- É mentira!! Eu só engoli vidro!!

- Credo! Estava tão mal assim???

Mostrei os dentes caindo, e expliquei o problema, até que se convenceram. Na minha frente, a solução: um cantor e um baixista, novinhos em folha, e cheios de dente. Substituição!

O que se sucedeu a partir de então, já não lembro bem. Só sei que os amigos foram mesmo me substituir, gentilmente, enquanto eu chorava, inconformável, dentro do ônibus da banda.

Até que chegou um ex-namorado meu, jovem cabeludo de predicados estéticos animadores, e ficamos ali, sozinhos, dentro daquele ônibus escuro, afastado de tudo e todos.

Já disse que não lembro o que aconteceu, pô!!

***
Moral da história: boi desdentado também pasta.

02 outubro 2002


ERRATA

Errei, errei!
Eu não tinha 9 anos quando da novela Top Model, mas uns 12. Quase me rejuvenesço três anos. (Mal, não faria).

Deve ser a crise dos 25 anos - que eu farei no dia 24 de novembro próximo, se Deus ajudar e a Benedita deixar. Mandem brindes!
Imagine, 25. Eu tinha certeza de que, aos 25, seria uma mulher formada, bem sucedida, linda e cheirosa, a fazer compras no shopping com o Breno (filho, já com um ano e meio) e um certo Capitão Rodrigo (maridão, claro).

Mas tudo passou tão de repente, foi até divertido, nem cansei, todavia, muito embora esteja feliz como pinto no lixo, não arrumei canudo algum, nem tampouco sucesso, lindeza, Breno ou Rodrigo. Vai-se vivendo, oras.

Esta coisa de planejar é comum aos mortais, mas carece um pouco de inteligência. Dos planos que fiz, poucos vieram me dar bom dia na vida real.

O plano bom é aquele que, ao invés de ser planejado, planeja a gente. É o pensamento que te pensa, o sentimento que te sente, a vida que te vive.

Quando eu comecei a tocar violão, tinha certeza absoluta de que a coisa mais difícil na vida era fazer um Fá maior. Aquilo não era pra mim, definitivamente. Cantava com gosto, mas cheia de pé atrás. Minha mãe dizia “te solta!”

O plano vinha me comendo pelas beiradas. Sorrateiramente, o sentimento me sentia, e o pensamento me pensava: no fundo, é exatamente nessas seis cordas que eu vou me segurar enquanto ainda não puder me soltar.

Com o tempo, fui caindo cada vez mais dentro. Dentro da caixa do violão, onde o barulho é mais intenso e a gente sente a vibração de cada nota no peito... diacho, o peito. A primeira coisa que eu vi – e me encantou – no contrabaixo foi justo o peito. O meu, que ficava tremendo ao som do grave produzido pelo instrumento.
Outro plano que eu não planejei – o baixo me pegou pelo peito, e não larguei dele até hoje.

Essas coisas que a gente não entende. Quando me perguntam “e por que o contrabaixo?”, eu me seguro para não cair no ridículo de dizer: toco baixo porque o baixo me tocou primeiro.

Paupérrimo, não? Pura verdade.

Assim que eu parar de tomar essa vacina anti-Breno, e se, então, o Breno vier chorar na minha vida, terei muito prazer em oferecer-lhe meu peito para que possa se tornar uma criança saudável – alimentada de um leite grave, cheio de oitavas abaixo, dedilhado profundamente com muito amor e alguma melodia, que ninguém é de ferro.

Um leite em fá maior, leitinho afinado de quem seguiu, sobretudo, o instinto. Na hora de compor – vida ou canção -, garanto que não há coisa melhor.
Ah, eu acho engraçado. Quer dizer que estão reivindicando atualizações no BiBlog, como se clientes fossem? Ok, eu mereço. Agradecemos a preferência. A sua ligação é muito importante para nós.

Mais de 5 mil visitas neste site, e eu continuo cada vez mais dura, tentando escrever um livro para ver se descolo algum, concentrada nos meus personagens, enlouquecendo meus pobres amigos que já não sabem se sou fruto de ficção ou realidade, sonhando viver de brisa ou vento ou poesia mesmo. E me vêm cobrar assiduidade artística.

Pois bem, caríssimas leitoras (suspeito só ter mulher me lendo, além do Duda e do Mano), cá estou, desprovida de inspiração, mas nutrida de afeto pela literatura até os dentes. Nove da manhã de quarta-feira, acabo de ler no Globo que “o tráfico planejou ação que parou o Rio”.

Chega a ser engraçado – perdoem meu humor negro e, por vezes, infame. Primeiro, que o rio costuma correr indefinidamente, já diziam os poetas antigos. Hoje em dia, eis que o rio pára.

Diziam os telejornais extremamente confiáveis da nossa cidade, ontem mesmo, que “uma onda de boatos fez o comércio parar em alguns dos bairros do Rio de Janeiro”. Imagina, falando assim, boatos. Parece coisa de gente doida, que um passou para outro, que passou para outro, e acabou se formando uma ondinha, quase uma marola, que – olha só! -, plim!, parou a cidade.

Comerciantes desvairados, à beira de um surto descabido de pânico, simplesmente acharam melhor perder fortunas, no final de um mês tenso de economia instável, porque “boatos” invadiram a cidade. Como fossem os ETzinhos do Mel Gibson, entortando plantações alopradamente. Boatos.

Hoje, o imparcial Globo afirma que foram os traficantes mesmo. Então eles existem, os traficantes?? Ora, quase me choco com tal novidade. Só falta me dizerem que eles mandam nesta cidade maravilhosa, agora. Só o que falta.

Nossa governadora, entretanto, diz que está tudo sob controle. Acredito que sim. “Tá tudo dominado”. Por quem, mesmo??

É por essas e outras, caros ouvintes – para variar a expressão -, que eu prefiro bater um papo com os ETs a enlouquecer meus poucos neurônios com essa gente de saúde duvidosa. Depois, a doida varrida sou eu.

Não consigo, contudo, deixar de me encantar por esta cidade amalucada e incoerente. De um lado, mar. Do outro, montanha. Só podia mesmo dar nisso.

Há quase cinco anos, trouxe meus trapos e hospedo meus versos por estas bandas. Daqui não saio, daqui ninguém me tira. A confusão inspira, amigos. E a confusão, em si, pira. (Sorry).

O Rio de Janeiro virou parente: só eu posso falar mal, sabe como é? Se pego alguém maldizendo a cidade, viro bicho. Meu bairro, então, é sagrado. Fale mal do Recreio e arrume uma inimiga de carne e prosa.

Ainda lembro, como se fosse ontem, a primeira vez que pisei nesta terra. Turismo em família. Viemos ao Recreio dos Bandeirantes, que pouco era além de mar e mato, e conhecemos parte do cenário da novela Top Model – a Malu Mader era meu ideal de mulherão, eu tinha nove anos e muita fantasia na cabeça. Lembra, mãe?

A “casa do Gaspar” (Nuno Leal Maia, na época em que eu nem valorizava um telhado grisalho tanto assim) era um sonho real. Eu estava em Hollywood, eu era feliz.

Tinha a “barraca do Sal(danha)”, onde o Evandro Mesquita interpretava um surfista natureba pra lá de atrapalhado que vendia sucos e lanches. Aqui, bem no Recreio. Eu estava vendo tudo aquilo, sonhando em me tornar a Malu Mader ou coisa parecida, e pedindo ao papai do céu que, assim que minhas pernas fossem grandes o suficiente, me pusesse a morar nesta cidade-cenário.

Ele me pôs.

Não me tornei a Malu, nem tampouco coisa parecida. Pensando bem, talvez coisa parecida: Malu-ca eu consegui ser.

Já é alguma coisa.

28 setembro 2002

PORRE DE NESCAU LIGHT NA NIGHT DE SÁBADO

Experimente ficar em casa, num sábado à noite, e encher a cara de Nescau. Mas vá com calma: escolha o “light”, para não acordar pesando mais no domingo. E use leite desnatado. De uma só marca – dizem que não se deve misturar bebida.

É o que estou fazendo hoje. Acabo de notar que já se foi mais de meio litro de leite, e ainda nem senti a tonturinha aquela. Bom, não? Tenho várias caixas aqui; prometo me esforçar e só ir para a cama quando estiver achocolatadamente embriagada.

Enquanto isso não acontece, bato um papo aqui com vocês.

Eu bebo é para esquecer, meu filho. Minha amiga foi viajar com o maridão para a região dos Lagos – olha que chiquérrimos! -, e eu fiquei por aqui mesmo. Meu único amigo e baterista, o Lori Guimarães, deu-me uma dispensada quando o convidei, já meio de lado, para darmos uma volta pelo centro da cidade, ou Lapa. Ele já tinha umas voltas agendadas com alguma pretendente, e as amigas sempre sobram para o Nescau quando pinta alguma pré-namorada ou casinho. Mais que justo.

Meu irmão saiu com a namorada, foram curtir a “night”.

E eu estou, novamente, sem namorado. (A propaganda é a alma do negócio, hoho).

Se morasse no Flamengo, ou na Glória, ou na Tijuca mesmo, poderia muito bem descer e entrar num boteco desses, fazer amizade com alguém. Mas, aqui, no Recreio dos Bandeirantes, o boteco mais próximo fica muito longe para se ir a pé. E meu irmão saiu com o carro.

Hoje eu fui ao cinema à tarde e, na volta, já muito mal intencionada, passei numa lojinha de conveniências e enchi uma cestinha com leite Parmalat. Bêbado é fogo, faz tudo de caso pensado mesmo. Olha o meu estado, olha o meu estado!, e ainda nem são 10h da noite.

Que filme eu vi? “Sinais”, com o Mel Gibson. É filme de ETzinho, eu me diverti.

Digamos que o Mr. Gibson, esteticamente, já não me agrada lá muito. Na verdade, nunca me agradou – não sou fã de olhos azuis, principalmente em homens. Ele estava charmoso, não mais que isso. (Sorry, Melzinho, capaz de você não dormir hoje, depois que passar aqui, como de costume, para ler meu Blog... mas a verdade precisa ser dita).

Se bem que, depois de umas doses de Nescau, acho que eu até encarava.

Mas chega de Hollywood, que esse papo já está me dando enjôo. (Ou seria o Nescau?) Agora ouço a rádio MPB FM, um desses oásis que a gente encontra no dial hoje em dia. Rola um Djavanzinho, Nana, Melodia, Chico, João Bosco, Caetano, Zeca Baleiro, e o Gil me dizendo “não chores mais”, como quem diz “larga dessa vida, deixa o Nescau pra lá... tudo, tudo, tudo vai dar pé.”

Já sei, vai aparecer um engraçadinho no SHOUT OUT para me perguntar “vem cá, tem certeza que era Nescau mesmo que você estava bebendo??”, de modo que já esclareço: sim, é Nescau Light, juro pela felicidade dos ETzinhos do Mel Gibson.

Neste momento, a lindíssima Paula Toller canta Casinha de Sapê – eis algo mais doce que o meu choco-porre desnatado -, e uns cachorros latem na rua só para quebrar o clima. Parmalat também. (Sorry, meu anjo, não resisti ao trocadilho).

Acho que já estou sentindo alterações na consciência. Quase choro com a Zizi Possi cantando “perigo é ter você perto dos olhos, mas longe do coração”. Isso é normal?? (Soluço).

Queridos, vou ficando por aqui, submersa no vício, que este pó (MARROM!) é um conforto, mas me deixa deveras sensível. Só pelo fato de eu escrever “deveras” já se tem uma noção.

Jamais escrevo “deveras” em sã consciência.

Boas noites, durmam com os anjos, que já vou indo embora. Rezando para não topar com nenhum bafômetro virtual no caminho.
Íííííííc !!!!

27 setembro 2002

AUTOPROPAGANDA & DICAS

* Fiquem de olho: em meados de outubro, reestréia o site “Oficina do Pensamento”, de conteúdo novinho em folha. Esta que vos fala será a colunista musical da oficina. Depois eu passo o endereço certinho.

** Quem puder, corra até as melhores prateleiras das melhores livrarias, e compre “Buscando o Seu Mindinho”, de Mario Prata, lançado pela Editora Objetiva. Esta que vos fala está lá, presente em crônica, na página 79. Discorro sobre a situação dos mindinhos no contrabaixo – como me convém. E o resto do livro também é muito bonzinho. Hehe.

*** Visitem o site www.carlosmaltz.com.br e adquiram o CD de Carlos Maltz (ex-baterista e fundador dos Engenheiros do Hawaii, hoje cantor e compositor), de nome “Farinha do Mesmo Saco”. Esta que vos fala (de novo) está lá, presente em baixo e voz, na faixa “O Sorriso do Escorpião”. E o resto do CD também é muito bonzinho. Hehe.


PRESENÇA DE JOSÉ MAYER

Saco!, não sei por que foram reprisar Presença de Anita logo agora. Infelizmente, tenho que assistir todo santo dia. Impossível ir para a cama sem o José Mayer, sabendo que ele anda desfilando aquele charme grisalho bem em frente ao meu sofá da sala, ao simples ligar de um botãozinho. Irresistível.

Rede Globo 1 X 0 Bíbi Da Pieve.



PEGANDO INTIMIDADE COM ELE - PARTE II


Tem gente que só reza quando está aflito. Eu, como prezo os deuses e os santos e o mais que paira noutro
mundo, converso com essas figuras todas as noites. Estou aqui, minha gente - eu digo -, não é para pedir nada. Só
vim pegar amizade, mesmo.

A pessoa vai ficando íntima aos poucos; assim é neste plano, não deve ser diferente nos outros, se é que há outros. O negócio é pegar amizade devagar, porque um dia a gente precisa de verdade e aí não fica bem chegar de supetão e pedir coisa.

Já deu vontade de pedir uma grana, um namorado gente boa (com furinho no queixo) e até um pouco mais de paz. Mas não peço. Anoto, e guardo tudo para quando estiver mais chegada.

A lista vai engordando, assumo, e pior ainda fica em tempos de crise. Mas não tem nada, que eu já estou quase chamando todo mundo lá pelo primeiro nome.

Jesus é um. Já me deu abertura, inclusive, para deixar de "senhor isso", "senhor aquilo". Jesus é você.

Dona Maria, mãe de Deus, ainda não consigo tratar sem o dona. Respeito, acho. Mas, assim que eu tiver a
idade dela, vai virar você também.

Onde quer que eu vá, levo a minha listinha. Nunca se sabe; se calhar de eu morrer antes da hora, já chego por lá preparada e peço pessoalmente, vou direto ao assunto:

- Seguinte. Passei a vida toda de conversinha com vocês, de modo que mal morri e já me sinto em casa. (Sento e cruzo as pernas.) Aqui está a minha lista de pedidos, mas preciso fazer umas observações. (Levanto, para soar enfático.) Paz, por exemplo. Esse negócio de paz era mais para disfarçar, achei que ficaria bonito, e tal. Mas não se preocupem com isso. Vamos direto ao dinheiro, que pode vir, naturalmente, na próxima encarnação. Mas, que fique claro: vai render uma eternidade de juros! Ou nasço podre de rica, ou sigo morta até vocês me descolarem a grana.

Aí eles vão me dar um protocolo, e me mandar esperar ali na sala ao lado. Não admito:

- Sala ao lado? Não vou. Fico aqui até ser atendida, tenho direito, nunca pedi nada em vida! (O dedo em riste.)

Burburinho, gente recém-morta e veteranos falecidos falando ao mesmo tempo, o pessoal do balcão indignado com a minha astúcia. Sigo:

- Me chama o Jesus. Me chama o Jesus, e vamos acabar com esse reboliço de uma vez. Ou a Maria, qualquer um.

Interfonam para Jesus, dizem que tem uma doida querendo furar a fila. Ele aparece, do nada, e me reconhece.

Pronto, calei a boca de todo mundo. Fui levada para uma sala vip – com cafezinho e broa de milho feita pela Maria -, e tirei uma foto com o cara.

- Na próxima encarnação – ele me disse -, tu levas esta foto e ficarás rica.

Não estou dizendo que é bom ir pegando amizade aos poucos? Morri cedo, mas morri bem. E ainda rolou a maior tietagem.