01 agosto 2002

PARA MARISTELA KAYSER BOCK

Tu me manda um e-mail, Maris? Ou escreve aqui no SHUOT OUT o teu e-mail, que eu não tenho aqui, e dá saudade, e quero mandar coisas, mas não consigo. Beijos no Jesué e na Pri, e beijos pra ti também!

PARA TODOS

Oi, gente, hoje estou um sem inspiração e com preguição, de modo que vou postar aqui uma crônica antiga minha que eu acabei de achar. Beijos.


Quanto vale uma escova grátis?



Bíbi Da Pieve



Imagine que o seu casamento esteja meio sem graça. Precisando de um tempero - que você cisma em chamar de "investimento".

O Adelmo anda distante, e, quando resolve chegar mais perto, você não quer saber.

As afinidades evaporaram depois do primeiro ano de convivência. Faz três anos que vocês se enfiaram nesse quarto-e-sala com paredes descascando. Tudo ia muito bem, ele até fazia as suas unhas de vez em quando. Mas, hoje em dia, o clima é de cortar com a faca: mal se olham.

Antes que as paredes desabem de vez - você pensa -, é melhor eu investir no meu relacionamento.

Pronto. Parece que o mundo inteiro adivinhou suas necessidades: internet, televisão, revistas, livros e sex-shops oferecem rápidas e práticas soluções para o seu problema.

Será que isso é um sinal? - você questiona -, ou toda essa indústria já exisitia antes do Adelmo, e já torcia para que eu o encontrasse um dia, casasse com ele, e, depois de três anos, decidisse investir num relacionamento mal das pernas?

Não importa. O Adelmo vale o investimento; você saca meia-dúzia de manuais sobre casamento, uma camisola de rendinha, faz o pé e a mão no salão mais caro, e ainda sai achando que está no lucro - ganhou uma escova grátis.

Devorados os livros, decoradas as dicas práticas, entendidos os fundamentos psicológicos das diferenças entre os sexos, alisado o cabelo e lixado o pezinho - você está pronta para mudar de vida. Afinal, o Adelmo é o príncipe que todas as suas amigas pediram a Deus (lindo, alto, louro, vinte e tantos), e você prometeu a si mesma um
happy end digno de Hollywood.

Mas faltou um detalhe: um bom vinho, para brindar à lua-de-mel do investimento.

Atrasada, você passa na delicatessen mais próxima ao quarto- e-sala descascado, desce do ônibus num pulo, quebra o salto, e cai de joelhos na sarjeta. Chove muito. O cabelo empaçoca e espiga.

É quando aparece, do nada, o gaúcho Kleiton - que você não vê há uns quinze anos -, e lhe dá a mão. Você levanta, gagueja; não sabe se ri, chora, abraça, beija ou engole o salto quebrado.

E você também não sabe há quanto tempo não sente isso, mas desconfia que faça uns quinze anos - desde que o Kleiton, seu amor platônico de adolescência, resolvera ir tocar percussão no Canadá.

Agora ele deve estar com quase cinqüenta; é baixinho, careca, meio barrigudinho, mas continua com o mesmo olhar: desconcertantemente percussivo. Durma-se.

Mas como, se você não deixou passar uma linha? Se você decorou todas as dicas, comprou os melhores perfumes, usou os melhores esmaltes - como é que pode, agora, um batuqueiro sulista vir atrapalhar o seu investimento no Adelmo?

Acontece, minha cara. Esse tipo de Kleiton não escolhe suas vítimas. E a maioria dos manuais de "felicidade" não vêm com a letra "k" no índice.

Nada contra os Adelmos, os livros de auto-ajuda e as pedicures. É que - particularmente - tenho uma quedinha pelos saltos quebrados, pelos encontros inusitados, e pelas tempestades - que são intensas justamente por serem naturalmente crespas, sem investimento algum.

E sem escova grátis.