30 janeiro 2003

Tive pesadelo com assalto, mas fui salva no final por um carro de segurança particular, um Gol branco com um homem esperto dentro. O menino que tentava me assaltar era muito novinho; ele tinha uma arma de brinquedo só para disfarçar – e outra, de verdade, dentro da mochila.

Fiquei desesperada na hora em que o homem descobriu que o menino estava armado de verdade, e mais desesperada ainda quando ele cochichou para mim “vou te dar um revólver, mas é só para te defender, não vai ser preciso usar...”.

Se não fosse preciso, ele não me daria uma arma – foi o que eu pensei na hora, enquanto pegava aquilo com a mão esquerda, tentando evitar que o assaltante percebesse a manobra. Deu certo, e não foi mesmo preciso atirar.

Só lembro que, no final da história, o segurança conseguiu evitar o assalto, imobilizando o menino e tirando tudo dele.
Não se ouviu um disparo, mas o clima era tenso demais, e eu acordei agitada.

***

Quando dormi de novo, sonhei que meus dentes (todos) estavam caindo, um a um. Eu tentava disfarçar, porque estava em público. Levava a mão à boca, retirava um dente, e punha no bolso. E assim por diante, até que fiquei totalmente banguela.

O ponto alto do sonho foi quando meu punhado de dentes foi parar dentro do MOCOTÓ que um amigo do meu pai estava preparando num panelão, ao ar livre. O acidente se deu quando meu irmão me pediu a chave do carro, e eu, num gesto desajeitado, enfiei a mão no bolso errado, apanhei os dentes achando que era o molho de chaves, estendi o braço por cima da panela, e... derrubei tudo lá dentro.

Eu não sabia se chorava mais de vergonha pela patacoada no meio do evento, ou pela banguelice em si. Motivos não faltavam, enfim.

Acordei, ainda apavorada, e só sosseguei quando senti os dentes com a língua.

***

Andam bulindo no meu jornal.

O entregador aparece sempre bem cedinho, pouco antes das 6h. Hoje, acordei às 8h e fui pegar o jornal na porta. Em vão.

Eu já desconfiava, e meu irmão também já me havia advertido do problema. O vizinho não-assinante madruga, surrupia o folhetim alheio, e toma seu cafezinho ao desfrutar da leitura gratuita. Muito bonito.

Lá pelas 9h ou 10h da manhã, quem aparece em frente à minha porta? Todo arrumadinho – mas, evidentemente, desvirginado. Sim, porque o periódico, quando ainda é donzelo, a gente percebe de longe.
Jornaleco devasso é muito diferente.

Por mais que esteja dobrado reto, nunca está lisinho. Sempre há alguma ruga, uma manchinha aqui e ali; enfim, claras denúncias da infidelidade.

Já aconteceu, algumas vezes, de eu chegar de algum trabalho noturno – música, música! -, junto com o jornaleiro. Nesses casos, levo a melhor, e acabo inibindo a traição do vizinho com as minhas imaculadas notícias. Mas, na maioria das vezes, confesso que tenho sido chifrada e não paga.

Diante de tamanha cara-de-pau desse misterioso maníaco do primeiro andar, só posso concluir: preciso bolar uma arapuca para pegar o cretino.

Já pensei em ficar de tocaia, entrincheirada no quartinho do lixo, só esperando o arrastar dos textos para a porta ao lado. No momento do ato, eu pularia em cima dos dois, e acabaria de vez com essa farra matinal.

Mas eu não me prestaria a tal papel. Não sou do tipo que faz escândalos; costumo agir com classe.

Primeiro, preciso saber quem é o crápula. Para isso, contrato uma faxineira, que se fingirá de funcionária do prédio, e madrugará limpando a ardósia dos corredores do primeiro andar. Em poucos dias, ela desmascarará o traidor, e me dará o serviço completo.

De posse da identidade do bandido, telefono para alguma editora de revistas de mulheres peladas, e peço que me venham oferecer assinatura, pessoalmente. Na porta do vizinho, é claro.

O tarado, certamente, não vai resistir. Se gosta de bolinar jornal, que dirá revista de mulher nua.

Ele assinará na hora. No dia da primeira entrega, eu confiscarei o exemplar, e devolverei, minutos depois, no capacho do vizinho. Claro que vou procurar alguma celulite ou estria naquela turma de beldades, só para não perder o hábito, mas nem vou me demorar: o mais importante é lavar a revista com bastante água corrente, página por página.

Nada como pagar na mesma moeda. O corno do meu vizinho, quando esperar encontrar suas mulheres peladas intactas, terá a grande surpresa - elas estarão todas desvirginadas, e, pior, dando a maior bandeira: quem aparece de cabelinho molhado é porque sequer respeita o cônjuge!