23 março 2003

NÃO PERCAM PAULA SCHÜTZE

O texto a seguir eu encontrei no (imperdível, necessário e vitaminado) blog da Paula

Pelos comentários que ela recebeu no blog, notei que muita gente “captou”, mas muita gente não sacou, de fato, o que ela quis dizer com essa gracinha de texto.

A Paula tem 25 anos, como eu. No entanto, dificilmente a gente encontra na internet algum escrito que realmente soe como “era isso que eu queria dizer, mas nunca consegui!”. Isso é raríssimo.

A Paula escreve sobre relacionamentos muitíssimo melhor do que eu, e tem uma sensibilidade misturada ao humor fino que acaba comovendo, ao mesmo tempo em que dá um “tapa na cara” sutil – embora claríssimo!
É por isso que eu deixo vocês com ela hoje, e me calo em absoluto consentimento. Inclusive quanto aos brócolis!
Divirtam-se.

***

E isso passa na televisão

(Paula Schütze)

Ei. Alguém assistiu “Globo Repórter” hoje? É o tipo de programa que só se assiste quando o assunto é realmente interessante- a menos que você seja um ativista do Greenpeace e queira saber tudo sobre lontras, dromedários, animais marinhos e vida silvestre.

O assunto em questão? Loucuras de amor. Histórias cinematográficas demais, como a da paraibana que casou pelo celular com um cara de Foz do Iguaçu. Nada daquilo me pareceu familiar, embora eu desejasse lá no fundinho que alguém fizesse por mim uma loucura, mesmo que fosse mais plausível, palpável. Como as flores que eu costumava receber nos tempos de cursinho, CD´s personalizados na época da faculdade. Cartões. E-mails. Fotos. Hoje eu considero tudo isso loucura. Ninguém mais faz; achei que fosse comigo. Mas eu também parei de fazer coisas pras pessoas há algum tempo.

Tá todo mundo muito sozinho, todo mundo se lamentando, todo mundo trabalhando o dia todo, querendo chegar em casa e encontrar uma pequena surpresa. Ou ser acordado 5 minutos após pegar no sono por uma ligação breve, mas importante: “liguei pra te dar boa noite”. Assim, todas as noites seriam inevitavelmente boas.

É, tá todo mundo sozinho. Eu estou sozinha, tenho dúzias de amigas e amigos sozinhos. Tem gente anunciando no jornal, em blogs, no rádio que seja: não quero mais ficar sozinho. Mas, de fato, fico perplexa quando descubro, todo dia, que na verdade só queremos mesmo... continuar sozinhos.

Não existe mais paciência, petulância, insistência, conquista. É oito ou oitenta, você tem que me amar agora ou eu vou me cansar de você em dois tempos e dizer que a nossa história já não é mais a mesma. Tchau.

Eu quero um compromisso, como se amanhã fosse bater à porta da minha casa o cara perfeito, do tipo que “me compra brócolis”, me liga no final do dia, e - ainda por cima!!!- suporta minhas variações de humor. Admito, eu não tenho feito grandes esforços pra encontrar as pessoas certas, ou pra entender as erradas.

Ninguém tem feito. Ninguém faz nem ao menos sua própria parte. E isso poderia ser uma colocação das mais piegas, do tipo: vejam só, este mundo está perdido, estamos todos fadados à solidão. Morreremos- novamente- sozinhos numa cama quentinha, como a velhota do Titanic. Mas até aquela uva passa tinha uma história de amor pra contar.

Todos querem contar histórias de amor, arranjar alguém que sossegue essa coisa que fica ululando dentro do peito. Mas para o momento, sempre parece mais interessante viver uma vida louca, desregrada, pontuada por histórias de sexo, drogas e rock´n roll. Dizer que passou o final de semana embaixo das cobertas é final de carreira quando, na verdade, poderia ser só o começo.

Tudo porque alguém – quem? – resolveu convencionar que relacionamentos perfeitos acontecem entre pessoas perfeitas e nos levam, invariavelmente, a uma imensa e inestourável bolha de sabão que nos isola do mundo. Se você namorar alguém, vai ter que viver só pra isso, esquecer dos amigos, das festas e dos momentos em que gosta de ficar sozinho no quarto olhando pro teto.

Quem inventou isso, hein, quem?

Quem foi que disse que a mulher da sua vida nunca tem sono, nunca fica bêbada, quer fazer sexo no quarto encontro e- além de tudo- fala aberta e tranqüilamente sobre tudo o que sente?

Quem foi que disse que o homem da minha vida obrigatoriamente tem cabelos desgrenhados, gosto musical apurado, me faz rir e sabe cozinhar?

Eu acho que deve ser por isso, por essa insistência atrás de uma perfeição (que não existe), e, principalmente, pelo nosso hábito de sair julgando e condenando todo mundo que pisa na bola assim ou assado, que estamos, definitivamente, fadados a morrer numa cama quentinha, acometidos pelo mal do século: vazio. Sem história alguma pra contar.

trilha sonora: Goo Goo Dolls- Black balloons