03 maio 2005

Bons dias


Ainda friozinho no Rio. Benzadeus. Levantei da cama e fui direto ao armário pegar algo para vestir. No que eu olho aquela pilha de roupas - a minoria em uso, a maioria em coma absoluto há meses (anos, talvez!) -, começo a tirar tudo prateleira abaixo. Chega de roupa doente. Vincos de dobras feitas há séculos. Pretos desbotados, brancos encardidos, beges deprimidos, amarelos anêmicos. Mangas sem pulso, golas asfixiadas. No pasaran!

Lenços guardados choram sozinhos.

***

Confessando bem
todo mundo faz pecado
logo assim que a missa termina.
(Chico)

***

Sonho


Eu entrava num táxi, o motorista me dizia:

- Desculpe, senhora, mas eu não trabalho assim.
- Assim como?
- Levando as pessoas aos lugares.
- Não? E o que é que você faz dirigindo um táxi, então?
- Eu só comprei o carro, não tenho culpa se ele veio pintado assim.
- Ah, tem sim! Pensei que era um táxi, acenei e você parou!
- Parei para explicar à senhora. A senhora entrou porque quis.
- Entrei porque preciso ir para casa! E estou cheia de sacolas! Agora você vai me levar.
- Não posso, senhora. Tenho um compromisso.
- Onde fica o seu compromisso?
- No Recreio, senhora. (O engraçado é que ele falava como motorista de táxi, tinha cara e jeito de motorista de táxi, e se vestia como motorista de táxi.)
- Mas é lá que eu moro também! Você pode me levar, então.

Como ele percebeu que eu – como diria o presidente – não ia tirar o meu traseiro do carro dele, resolveu me levar. Chegamos na minha casa, eu pedi que ele encostasse. No que estou procurando dinheiro na bolsa, bate no vidro dele um cara muito mal encarado. Ele faz que vai abrir o vidro, eu grito:

- Não!! Não abre, que é ladrão!! Arranca o carro, rápido! Sai daqui!!!

Ele arranca. Eu peço que dê umas voltinhas antes de retornar à minha casa – vai que o ladrão ainda está lá esperando...

Ele começa a dar umas voltas. Estaciona em frente a uma casa que não conheço. Me convida para descer. Desço.

- Onde é que nós estamos? – Pergunto.
- Na casa de uma amiga minha.

Entramos. Tem uma festa, ele começa a cumprimentar todo mundo. Fico morrendo de vergonha, não conheço ninguém. Era o tal compromisso que ele tinha.

Olho num canto, tem alguns homens ao redor de uma churrasqueira. Fico indignada.

- Vem cá, isso aqui é um churrasco?
- É, sim senhora – ele responde, tranqüilo.
- Mas eu não como carne!!!
E ele, vingativo:

- Não tem problema, senhora. EU TAMBÉM NÃO SOU MOTORISTA DE TÁXI!!!!!!