10 agosto 2003

Preguiça, 1


Estou com uma preguiça homérica de gente que não escuta. Gente que, quando você diz “estou com uma dúvida, não sei se compro uma bicicleta ou...”, a pessoa emenda:

- Menina, eu já tive essa mesma dúvida!
- Mas eu nem disse qual é a dúvida, eu estava dizendo, e você...
- Isso! Isso mesmo. Imagina que eu, há dois anos, não sabia se comprava uma moto – foi moto que você disse, né? – ou se ia passar uma semana no nordeste com o meu então namorado, o Guto, lembra que te contei do Guto, aquele que tinha mania de comer sorvete com batata frita?
- Sim, lembro, mas eu dizia da minha dúvida...
- Calma, que eu já chego lá!! Esse teu ascendente em escorpião te tira toda a paciência, hein? Tem que trabalhar isso...

Bom, antes de “chegar lá”, ela passa pelo norte, nordeste, e vem descendo, de ônibus, com paradas estratégicas e detalhadas nos mais variados talentos do Guto, incluindo os emocionais, os artísticos, os sexuais, os uis, os ais... enfim, tudo.

De saco cheio. De saco bem cheio!



Preguiça, 2


Chuva fina e insistente no Rio de Janeiro de agosto de sempre.
Estou com preguiça da rua, das filas, do trânsito, das calçadas, dos ônibus imundos e das vans apertadas, do barro nos sapatos, da pressa das pessoas, das sacolas de supermercado, dos taxistas mal educados, das esquinas mal projetadas, dos sinais caolhos, das placas tortas, das folhas mortas, dos espirros, e – sobretudo - das canções que me dão saudade dos outros, injusta e covardemente.



Preguiça, 3


Meu irmão, aboletado no sofá:

- Leva esses pratos e o doce-de-leite daqui, e me traz uma coca? E senta logo, senão te peço mais coisa.

(Nada como uma vida e/ou uma banda em comum para tornar as pessoas leais e solidárias).