22 setembro 2002

PERDI TUDO OUTRA VEZ – O MUNDO É DO PORCO ELÉTRICO.


Eu queria que vocês tivessem visto a minha cara de indignada, diante do que se passou ainda agora comigo e esta encrenca da tecnologia que atende por microcomputador.

Eu tinha acabado de digitar um texto enorme quando, de repente, enfiei o pé na jaca da extensão que liga um fio a outro e desemboca na tomada. Vi uma tela negra na minha frente; o mundo pareceu sumir sob minhas botas de cano alto. Era o fim.

Perdi tudo outra vez. Desnorteada, ainda meio zonza, mordi os lábios com a força que Deus me deu, no intuito de não acordar a vizinhança, nesta cinzenta manhã de domingo, com expressões de baixo calão.

Não adiantou porra nenhuma.

Um segundo depois, minha boa intenção foi parar lá onde o diabo perdeu as botas – ou seria Judas? -, de modo que soltei o grito, com afinco:

“PUTAQUIPARIU!!!!!!!!!!!!!!!!!!”

Nove da manhã. As paredes aqui são muito finas. Metade do prédio, a metade que me cerca, fatalmente está, no momento, a indagar-se sobre quem teria sido a filha da p*** a ter tomado umas e outras e enfiado o dedo na tomada – ou coisa que o valha, porque o berro foi grande.

Outra metade, a metade que ouviu de longe, deve estar morrendo de pena da metade que despertou, não com o cantar do galo, mas com o estardalhaço de uma galinha insatisfeita, injuriada e extremamente bem dotada de predicados vocais – no sentido do grito, mesmo.

É nisso que dá. Estamos todos “conectados”, não estamos? Pois então. Enchemos a boca quando aprendemos a palavrinha mágica: conexão. Agora, estamos aqui, conectados e mal pagos.

Patético. Todo conhecimento de uma civilização cabe em dois furinhos, somente dois furinhos que muito lembram um nariz de porco. Fizemos um serviço suíno, de fato. Aprisionamos nosso próprio mundo num porco elétrico, frio e calculista, que deve estar, a essa altura, a nos fitar com aquela cara deslavada, assim dizendo: “ÓINC!! ÓINC!!”, e zombando da nossa desgraça.

O mundo agora é do porco elétrico. Nada mais há para se fazer.

Empacotamos tudinho – nossos livros, nossos discos, nossos dinheiro, nossas amizades e, se bobear, até o nosso sexo -, e demos de presente ao porco. O bicho que come e vira o cocho.

Felizes eram nossos avós, nos idos tempos em que o porco era tão frágil que, pobrezinho, acabava invariavelmente quebrado quando a coisa apertava e alguém decidia descer o martelo bem no meio dele. Vomitava umas moedinhas, e pronto: vovó ia à feira.

Hoje, que ironia, o porco retorna em grande estilo. Enfiando o nariz em nossas paredes, ele chega, de mansinho, iludindo, iluminando, conectando. E toma conta.

Eis a tradução para esta era tecnocrata de bytes desmedidos e conexões vitais: a vingança do porco.

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