25 dezembro 2002

Vocês são uns amores! Mesmo na minha ausência, apareceram para registrar votos de bom Natal. Obrigada! Retribuo com sinceros desejos de paz e felicidades para o próximo ano.

A minha noite de Natal foi ótima. Comecei tocando violão e cantando com a parentada, e terminei às 6h da manhã de hoje, chegando em casa acabada de uma festa com minha incansável prima de 18 anos.

Chegamos na cervejaria/boate pouco depois da meia-noite. Olhares inquietos, expectativas, esperanças, vestidos de vários tamanhos e estilos. Homens de camisa vermelha, cumprimentos, sorrisinhos ensaiados e improvisados. Aquela coisa.

"O que será que eles procuram aqui?" - meu lado sagitariano-filosófico-enfadonho ameaça botar as garras sobre a minha saudável noite fútil. Controle-se, é apenas uma noite. Fútil.

Resolvo me distrair com as belezas humanas desta terra abençoada por Deus, e me encanto por um daqueles vários meninos de vermelho - que, para meu desânimo, engata-se de súbito a uma loura monumental, e desaparece entre os cachos dourados para nunca mais retornar a este reles mundo dos mortais.

Pronto. Menos um.

Relaxe, aconselho a meus neurônios mais afoitos, é Natal. Minha prima pergunta se eu quero dançar, eu pergunto quando vai começar a música, ela responde que é aquilo ali mesmo. Achei que estavam consertando alguma coisa na boate, pois o barulho mais se parecia com um martelo insistente do que, propriamente, com alguma canção. Mas ela reafirma: é isso aí que tem.

Pronto. Menos uma.

Não sou de dar carão; aceitei o convite e fui à luta. No início, me senti um pouco ridícula. Depois, foi piorando. Mas o importante é competir - eu me consolava, enquanto uma adolescente descompassada e meio bêbada se sacudia do meu lado, e depois ia se agachando até o chão, com as duas mãos na cabeça, e fazendo biquinho. Não estou tão mal assim, afinal.

Depois de uma "música" vinha outra, e outra, e ainda outra. Aquele aglomerado ia ficando cada vez mais parecido com uma coisa só. À medida que ia entrando mais gente na pista, a sensação era de que eu ia perdendo o controle sobre os meus próprios movimentos, passando a fazer parte de uma massa nervosa e compulsiva, ali, quicando ao bater de cada martelada. Era a dança.

- Quando não agüentar mais, é só falar... - ela me advertia, com olhar quase piedoso.

- Imagina! - eu tentava disfarçar.

- É só falar... - eu não conseguia disfarçar.

Joguei a toalha quando meus calcanhares já estavam dormentes, meus dedos pisoteados e esborrachados de inchaço, meus quadris apenas mexendo uma vez a cada duas ou três marteladas.

- Vamos dar uma voltinha? - ensaiei um sorriso e dei uma piscadela, como quem quer ver se encontra algum pretendente ou coisa parecida. Colou.

Ela saiu na frente, ainda rebolando ao ritmo da massa. Eu saí atrás, gemendo em silêncio e pisando manso, para ver se a sola dos pés latejava um pouco menos, se eu voltava a sentir as pernas, se a minha cabeça parava de clamar por duas aspirinas e silêncio.

O pretendente? Se meu travesseiro me aparecesse montado num cavalo branco, eu casava na hora. Com qualquer um dos dois.

Demos várias voltas pela boate, mas adiantou muito pouco. As minhas dores foram piorando; minha prima foi se animando. A morte era questão de tempo.

Agüentei no osso equanto deu. Passava das quatro da manhã quando eu sugeri que fôssemos indo, ela teria que viajar hoje ainda com a família, podia se sentir cansada... mas errei o alvo. Ela sorriu, tranqüila:

- Que nada! Tenho gás para virar a noite aqui dentro e depois sair de viagem, numa boa!

Mais uma hora quicando numa pista de luzes piscantes e fumaças variadas. Quem mandou eu não ser sincera? Bem feito.

Cinco horas, abri o jogo: o papo (?) está bom, mas a carroagem tá virando abóbora. Mais cinco minutos, e eu só saio daqui de cadeira de rodas.

Fim de combate. Chegamos em casa ao clarear do dia de Natal. Tirei a farda e a sandália, deitei na cama e ainda quis iniciar uma oração, mas confesso que o sinal da cruz foi só até o nome do filho.

Capotei com a mão no peito, como uma guerreira esgotada, porém feliz.
E já prometi a mim mesma: da próxima vez, vou de coturno. Muito mais adequado a esse tipo de enfrentamento pesado.


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