27 outubro 2004

Cultura de salão


Perua 1 (entrando no salão): Oi, amiga! Você tem ido à academia?
Perua 2 (fazendo as unhas): Oi, querida. Faz tempo que não vou! Com essa gripe que está pegando todo mundo, fica aquele povo lá enfurnado no ar condicionado, eu sou doida? Quero esse vírus pra mim, não.
P 1: É... Também não vou faz tempo.
(Silêncio para reflexão de ambas).

P 1: O diabo é que começa a cair tudo, né?
P 2: Rapidinho.
P 1: Passou dos trinta, a corrida é contra.
P 2: Se é.
(Silêncio para reflexão de ambas).

P 1: Homem não tem isso, né?
P 2: Homem não tem nada! Deve ser uma festa ser homem.
P 1: Pode crer. E a gente aqui, fazendo cabelo. Homem lá faz cabelo? Se um homem não tem cabelo, pode ir a uma festa, normal. Mulher, Deus o livre!
P 2: Peruca! Mulher paga o mico da peruca, se for preciso.
P 1: Peruca. E mais, é capaz do sujeito fazer sucesso. Olha lá aquele careca, que charme!!
P 2: Fazer o quê. Nosso nível de exigência com eles é bem menor. E mulher se arruma pra mulher, também tem isso...
P 1: Tá certa. Já viu um homem olhar pro outro e fofocar com o amigo: olha que cara desleixado, olha a cor do sapato dele, nada a ver com nada, olha o cabelo...? Nunca!
P 2: E homem lá sabe diferenciar cor? Tudo daltônico!
(Risadas gerais).

Interferência totalmente inusitada da depiladora, que grita, lá do outro lado do salão:

- Broxa!!!!!!

(Interrogação geral).

- Homem fica broxa. É o castigo de Deus.

(Silêncio total, em respeito à verdade irrefutável. P 1 faz o sinal da cruz e bate na madeira. Isola.)

***

A manicure 1 está de saída, cumpriu o horário e vai embora. Sozinha, enche de fita adesiva uma caixa enorme escrito: Arno. Um ventilador.

Manicure 2: Vai levar isso, mesmo?
M 1: Se eu vou levar? É claro que vou levar! Ganhei na rifa, vou levar.
M 2: De ônibus???
M 1: Que jeito?
M 2: E o Henrique?
M 1: Não teve conversa. Fiz de tudo, ele não quis vir me buscar. Diz que é muito contramão.
M 2: E você vai de ônibus, com esse trambolho?
M 1: Vou sim. Mas vou ficar um mês sem dar pra ele.
M 2: Aaaah, bom!

De modo que concluo: o problema nem era levar uma caixa enorme no ônibus. O problema era continuar dando pro sujeito que permitiu isso.

E não é que faz sentido?

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